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sexta-feira, 25 de setembro de 2015

*Um desafio à cristologia

Dom Vital João Wilderink, OCarm.
*In Memoriam

Em outubro de 1932, o Padre Tito Brandsma foi eleito reitor da universidade católica de Nijmegen. No dies natalis da universidade, ele fez um discurso sobre o conceito ou imagem de Deus. O discurso conheceu, mesmo depois da sua morte, repetidas edições porque conserva uma atualidade surpreendente.  Na época a formação teológica trazia o carimbo da neo-escolástica, caracterizada por uma linguagem especulativa e abstrata. Falava-se de Deus como se tratasse de uma espécie de realidade eterna, atemporal e imutável sobre a qual a nossa busca de peregrinos não tinha muito a dizer. Insistia-se, sem dúvida, na prática das virtudes, mas, como Tito dizia no seu discurso, não sem perigo de reduzir a vida espiritual a uma prática exterior. Para Tito, porém, Deus não independe de formas humanas de conhecimento que são marcadas pelo tempo e pelo contexto. Neste ponto ele insiste na necessidade de uma abertura em relação a novas evoluções na espiritualidade.
Ele começa o seu discurso dizendo: “Entre as muitas questões que eu me coloco, há uma que prende mais a minha atenção: é o enigma que o homem de hoje, tão convencido e orgulhoso do seu progresso, se afaste em tão grande número de Deus. Porque a imagem de Deus ficou tão obscurecida que a tanta gente não chega a dizer mais nada? Creio que seja  dever nosso olhar em torno a nós para esse fenômeno da negação de Deus. Não, porque devemos em primeiro lugar assumir uma atitude de defesa já existe apologia demais, mas, em vista desse fenômeno, deixar-se motivar para fazer conhecer a imagem de Deus em novas formas”.
O que Tito Brandsma procurava fazer era que aprofundar a fé submetendo as suas intuições ao exame crítico do intelecto e da sabedoria da tradição. Não por interesse próprio ou para ser original, mas para desembocar numa corrente que flui pelas artérias profundas do corpo da realidade. Sabemos que, entre nós aqui na América Latina, surgiu a partir de uma reflexão sobre a realidade, uma espiritualidade de libertação. Se espiritualidade é um processo que tem a ver com uma relação nossa com o Absoluto, é imprescindível ver a nossa inserção no mundo e no universo. Não podemos dizer que a plenitude do ser humano não tem nada a ver com essa realidade. Afinal somos um ícone do real.
            Ecclesia semper est reformanda. Também o corpo doutrinal, na sua tradição cristológica apela para uma reforma. É uma tarefa de grande responsabilidade uma vez que os dogmas estão entre eles intrinsecamente conectados. Não podemos passar com descuido sobre a rica herança teológica de dois milênios.
De outro lado há uma outra constatação feita inclusive por grandes estudiosos, de que o mundo se encontra diante de um dilema de proporções planetárias que exige uma mudança radical de "civilização", de sentido do humano, ou provocará uma catástrofe de proporções cósmicas. Isto exige um esforço inter-cultural para fazer um primeiro passo para uma conversão marcada pela esperança.
Não há espiritualidade cristã, nem carisma carmelitano quando se  passa por cima da condição humana na sua dimensão mais profunda e menos condicionada pelas vicissitudes históricas. Existe no ser humano um desejo de plenitude e de vida, de felicidade e de infinito, de verdade e de beleza que vai além das contingências religiosas e culturais.Para nós essa plenitude tem um nome: Jesus Cristo.
*Retiro da Província Carmelitana de Santo Elias. 28 de julho a 01 de agosto-2008. Belo Horizonte-MG.
*Dom Frei Vital Wilderink, O Carm, foi vítima de um acidente de automóvel quando retornava para o Eremitério, “Fonte de Elias”, no alto do Rio das Pedras, nas montanhas de Lídice, distrito do município de Rio Claro, no estado do Rio de Janeiro. O acidente ocorreu no dia 11 de junho de 2014. O sepultamento foi na cidade de Itaguaí/RJ, no dia 12, na Catedral de São Francisco Xavier, Diocese esta onde ele foi o primeiro Bispo.


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