Total de visualizações de página

Seguidores

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

A FÉ QUE MOVE AS CIDADES

No país, 334 municípios recebem 18 milhões de turistas religiosos, mas desenvolvimento local deixa a desejar.

PALMELO, ABADIÂNIA, JUAZEIRO DO NORTE E TRINDADE - É com a convicção de que a fé não costuma falhar que milhões de pessoas arrumam as malas todos os anos e visitam as várias cidades, de todas as fés, espalhadas pelo país. Dados do Ministério do Turismo mostram que existem pelo menos 18 milhões de turistas religiosos domésticos no Brasil, três vezes o volume de cerca de 6 milhões de pessoas que passam por ano pela Capela Sistina, no Vaticano. Só de estrangeiros, pelo menos 30 mil pessoas vêm ao país para este fim. São pelo menos 334 municípios em todo o território nacional que atraem esse tipo de movimento ao menos em uma época do ano. Em muitos, a população chega a dobrar em um único fim de semana.
A fé que move curiosos e peregrinos move também muitos municípios e sustenta famílias inteiras. Em cidades como Aparecida, em São Paulo, símbolo maior desse tipo de turismo no país, o Ministério do Turismo estima que os dez milhões de visitantes deixam, a cada ida à cidade, cerca de R$ 1.200, o equivalente a R$ 12 bilhões por ano. Não à toa, a economia dessas cidades se expandiu, nos últimos anos, a níveis muito superiores ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Entre 2000 e 2013 (último dado disponível) o PIB de Juazeiro do Norte, no Ceará, por exemplo, avançou 579,5% (a preços correntes). Nesse mesmo período, a economia brasileira cresceu 329%. Mesmo assim, a falta de um programa estruturado para aproveitar o alto fluxo de pessoas ainda impede que muitas dessas cidades, de fato, se desenvolvam economicamente.
O GLOBO percorreu cinco municípios que respiram fé e têm a religião como principal — e em alguns casos, exclusivo — motor da economia: a gigante Aparecida, em São Paulo; a Juazeiro do Norte de Padre Cícero, no Ceará; e as cidades goianas de Trindade, da festa do Divino Pai Eterno; Abadiânia, onde o médium João de Deus atrai 240 mil brasileiros e, sobretudo, estrangeiros por ano; e Palmelo, que com 2,4 mil habitantes se declara um município espírita. Juntos, esses locais atraem quase 16 milhões de pessoas por ano.

Segundo o Ministério do Turismo, há mais de 18 milhões de turistas religiosos domésticos no Brasil: três vezes mais do que os cerca de 6 milhões de visitantes que passam pela Capela Sistina, no Vaticano, por ano.

UNIFORME BRANCO E GRINGOS EM CASAS ESPÍRITAS

PALMELO E ABADIÂNIA (GO) - “Por que você acha que os hospitais estão sempre tão cheios? Nem todas as doenças são do corpo, tem doenças que vêm da alma, do espírito”. A frase é de Maria Nazaré de Jesus, de 60 anos, mas a crença é a mesma que move milhares de brasileiros a visitar médiuns ao redor do país em busca de cura para problemas físicos, emocionais e espirituais. Cravadas no interior de Goiás, as cidades de Palmelo e Abadiânia atraem, mensalmente, cerca de 22 mil pessoas. Para abarcar o fluxo de turistas, os municípios investiram em estrutura e hoje têm números comparáveis às grandes cidades do estado. Invadida por estrangeiros todas as semanas, Abadiânia, por exemplo, tem, com apenas 16 mil habitantes, 80 pousadas e 66 licenças de táxi.
Para se ter ideia, o Produto Interno Bruto (PIB) de Abadiânia cresceu 773% entre 2000 e 2013. Em Palmelo, a economia saltou 247,3%. No mesmo período, a capital Goiânia teve um incremento de 411% nesse indicador. Os turistas – nacionais e estrangeiros -, que lotam pequenas cidades como essas Brasil afora, querem conforto para as angústias, uma carta de quem já se foi e, sobretudo, a cura do que já desacreditaram os médicos convencionais. Focados em realizar as chamadas cirurgias espirituais, eles se instalam por vários dias. Alguns chegam a se mudar temporariamente.
Nazaré, a autora da frase que inicia essa matéria, e a irmã Maria Madalena da Costa Soares, 55 anos, por exemplo, montaram suas próprias pousadas em Palmelo, de olho no fluxo crescente de pessoas que descobrem a pequena cidade que se autointitula um município espírita. De fato, mais de 60% dos 2.400 moradores são seguidores da religião, segundo a prefeitura. No local, os médiuns são contados às centenas: o presidente do centro espírita Luz da Verdade, Barsanulfo Zaruh, calcula que hoje existam 350.
Nos meses de férias, a população da cidade quase dobra com a circulação de turistas que procuram na fé a cura ou o conforto: cerca de mil pessoas passam, por mês, pela cidade. Elas não vêm para um único dia. Ficam dez. Esse é o mínimo para quem busca as cirurgias. Sem quartos suficientes para atender a demanda nos períodos de pico, Nazaré e Madalena tiveram que ampliar seus estabelecimentos e contam que as pousadas da região seguiram o mesmo caminho.
– A cidade é movida pelo centro — afirma Madalena.

BUSCA POR TRATAMENTO E INFORMAÇÃO

Em uma proporção muito maior, a cidade de Alexânia movimenta 20 mil pessoas todo mês. O médium João Teixeira de Faria, o João de Deus, colocou o pequeno município de 16 mil habitantes no interior de Goiás no mapa mundial. Na mística rua onde fica a casa Dom Inácio de Loyola, escutar inglês, espanhol ou francês é quase tão comum quanto o português. O movimento é tanto que há tradutores para as principais línguas durante os atendimentos na casa e os cardápios e letreiros pelas ruas são bilíngues ou completamente em inglês. A fama do médium rodou o mundo e trouxe à cidade grandes nomes como a apresentadora Oprah Winfrey e a modelo Naomi Campbel.
Entre as celebridades nacionais, a lista inclui além de personalidades como Xuxa e Giovanna Antonelli, uma extensa relação de políticos. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, por exemplo, é rosto conhecido na cidadela. O movimento, sempre às quartas, quintas e sextas-feiras, faz girar a economia da Abadiânia. A estreita rua que dá acesso à casa, ladeada de pousadas e hotéis, fica lotada de táxis, vans, sotaques e línguas.
— Não tem loja aqui que não seja movida pela casa espírita — complementa Leonor Rosa, de 45 anos, dona de uma livraria espírita.
Nas estantes de Leonor há nichos separados para publicações em inglês, espanhol, alemão, francês e até russo. Ela diz que as obras básicas do espiritismo são as mais procuradas. Uma vez ajudados, eles querem conhecer mais sobre a religião ou são movidos apenas pela curiosidade que desperta a aura da cidade em que todos andam de branco.
A americana Heather Cumming, 65 anos, é figura conhecida na cidade. Ela fez inúmeras vezes a viagem de Nova York até Abadiânia. Ao visitar a casa pela primeira vez, há 16 anos, ela diz ter recebido uma missão do mundo espiritual, via João de Deus: deveria voltar outras vezes e trazer com ela mais estrangeiros que precisassem ser ajudados. Por anos, Heather levou à cidade excursões inteiras. Após muitas idas e vindas, ela se rendeu: arrumou as malas e se mudou definitivamente para a cidade. Hoje, ela tem uma pousada em Abadiânia e trabalha como tradutora do centro:
— Eu buscava amor incondicional e aqui senti isso. A verdade é que desde que cheguei aqui, nunca mais quis sair. 
A recomendação para que as pessoas vistam branco ou cores claras é das entidades. Assim são chamados os espíritos que realizam os atendimentos e são incorporados pelo médium. Aos desavisados resta comprar uma das centenas de opções de blusas, calças, shorts e vestidos da coloração recomendada. Na loja de Rafaela Lôbo, de 34 anos, uma única arara colorida contrasta com uma loja repleta de peças brancas. Lá, uma camiseta simples custa em torno de R$ 35. Os vestidos variam entre R$ 80 e R$ 100.
Agradecidas pelo tratamento, não é incomum que vários dos turistas retornem com frequência às cidades. Márcia Araújo Alencar, de 39 anos, por exemplo, é de Imperatriz, no Maranhão, e frequenta Palmelo há 18 anos. Diagnosticada com um câncer avançado na mama, ela recusou o tratamento de quimioterapia e radioterapia. Portando apenas os remédios alopáticos e muita fé, ela se mudou temporariamente para Palmelo em 2009. Curada, Márcia voltou ao Maranhão, mas faz questão de retornar à cidade goiana sempre que pode para ajudar nos trabalhos do centro.
– Fiz e refaço os exames com frequência: o nódulo agora é benigno.
Em ambas as cidades visitadas pelo GLOBO, não há cobrança pelos tratamentos. Basicamente, as duas casas se sustentam com doações e trabalhos voluntários. Algumas das medicações recomendadas por João de Deus são pagas, mas os voluntários da casa explicam que, para quem não tem condições, a entidade encaminha o remédio gratuitamente. Em Abadiânia, a casa Dom Inácio tem ainda algumas fontes de renda alternativas, que vêm da lanchonete construída dentro do terreno e de uma lojinha que vende desde livros, imagens e travesseiros até o banho de cristal. Este último consiste em uma sala silenciosa em que a pessoa pode se deitar e tem, acima dela, cristais coloridos posicionados sobre os chacras (centros de energia no corpo).
Esperança de cura com cirurgia espiritual

ABADIÂNIA E PALMELO (GO) - Ao subir no pequeno palco em frente a centenas de pessoas, Lúcia Beatriz Schveid caiu no choro. Após 20 anos de devoção ao médium João Teixeira de Faria, o João de Deus, e dois casos de câncer - um nas cordas vocais e outro no pulmão -, ela se diz curada. A solução, diz, demorou a vir.
— Eu te deixei na escuridão, deixei você achar que ia morrer, não foi? — diz o médium, já incorporado pela entidade, em meio a olhares algo curiosos, algo vidrados dos visitantes, na primeira aparição de João de Deus numa quinta-feira do mês passado.
A cura, por meio de cirurgias espirituais, é um dos principais motivos que levam milhares de pessoas ao ano a buscar médiuns mais ou menos famosos ao redor do país. Os tratamentos espirituais nem sempre são instantâneos. Muitas vezes, são feitos ao longo de meses ou anos.
Lúcia conta que chegou à casa Dom Inácio de Loyola antes da doença, levada pelo pai. Em 2006, quando descobriu o câncer nas cordas vocais, levou os tratamentos espiritual e médico paralelamente. Nos centros espíritas visitados pelo GLOBO, em Palmelo e em Abadiânia, a recomendação é de não abandonar o tratamento “terreno”. Cirurgicamente, Lúcia retirou as cordas vocais e fez um enxerto.
— Não deveria falar, mas falo perfeitamente. O médico dizia que nunca tinha visto uma recuperação como aquela — diz.
Em 2014, descobriu um novo tumor, no pulmão. Após a cirurgia, ela conta que o tumor, inicialmente de 8 centímetros, foi diminuindo de tamanho de acordo com o tratamento.
— Hoje existe apenas uma cicatriz no local.
Segundo os voluntários da casa Dom Inácio, em Abadiânia, a forma como o procedimento cirúrgico é feito - com ou sem corte ou uso de instrumentos - varia de acordo com a entidade incorporada. Algumas recebem o tratamento sem qualquer toque. Outras passam, sob o olhar angustiado e surpreso de quem assiste, por cortes visíveis, intervenções com uma enorme tesoura nariz acima. Mesmo nesses momentos, não há grito de dor no local.
Em Palmelo, os médiuns não costumam realizar cortes. O GLOBO acompanhou uma das cirurgias. A paciente, a goiana Edne José Militão, de 64 anos, foi diagnosticada em uma espécie de raio-x feito no centro, em que os espíritos apontam, por meio dos médiuns, os pontos a serem tratados. Segundo o exame, Edne deveria cuidar de vários problemas: nas articulações, na bexiga, nos rins e nos nervos dos braços.
O processo é rápido - dura cerca de 5 minutos - e consiste em uma espécie de passe sobre a pessoa deitada. Os médiuns garantem que, internamente, a cirurgia é real, o que exige de quem se submete ao tratamento, repouso e dietas específicas. Em Palmelo, todas as cirurgias são feitas nas hospedarias ou nos locais de estadia gratuita oferecidos pelo centro a quem não pode pagar. O grupo de médiuns designados para os procedimentos peregrinam pelas pousadas, sempre após as reuniões do próprio centro onde, com as palestras e os passes, eles se energizam. Já em Abadiânia, há mais estrutura na casa espírita para que as cirurgias sejam realizadas no próprio local.

Em Aparecida, negócios guiados pela peregrinação.

PA 14/06/2016 - PIB da Fé . Na cidade de Aparecida do Norte, a Basílica Nossa Senhora de Aparecida com números de 12 milhões de visitante por ano. NA cidade tem ha 2 anos um bondinho que liga o morro do cruzeiro ao pé da basílica.

APARECIDA - Principal centro de peregrinação católica do país, a cidade de Aparecida, a 170 quilômetros de São Paulo, atraiu no ano passado 12 milhões de visitantes. Em outros centros de visitação católica, como Fátima, em Portugal, ou Lourdes, na França, o número de fiéis não ultrapassa os 6 milhões anualmente. Até mesmo a Torre Eiffel, em Paris, contabilizou 6,9 milhões de visitantes em 2015. A fé que leva tantos romeiros a Aparecida é o motor econômico da cidade.
— Sem a devoção à Nossa Senhora Aparecida ainda seria um distrito de Guaratinguetá, como no passado — diz Márcio Siqueira, prefeito da cidade que, em alguns finais de semana, vê sua população, de 37,5 mil habitantes, quintuplicar.
Nas contas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a economia de Aparecida movimenta quase R$ 600 milhões, ou cinco vezes mais que o orçamento da prefeitura previsto para este ano, de R$ 120 milhões. Mas é consenso que há uma riqueza subterrânea que não é captada pelas estatísticas oficiais.
— Há muita informalidade. Por exemplo, temos 2,6 mil ambulantes que todo fim de semana montam suas barracas próximo à Basílica. Embora tenham licença da prefeitura, não sabemos quanto movimentam porque não são formalizados. Temos ainda umas 350 fabriquetas de fundo de quintal que fazem lembrancinhas e vendem a R$ 1 ou R$ 2 — explica Ângelo Reginaldo Leite, presidente da Associação Comercial e Industrial de Aparecida.
Segundo a Associação Comercial, o gasto médio do turista com diária de hotel fica em R$ 120, incluindo café, almoço e jantar. Com lembrancinhas, calcula-se que cada um gaste R$ 60, em média.
A modelo Paula Tomie Nagai, de 34 anos, moradora da cidade de Mogi das Cruzes, no interior paulista, planejava passar cinco dias na cidade. Foi pedir uma graça à padroeira do Brasil para que cessem as dores no pé esquerdo, que torceu há alguns meses. Segundo ela, os médicos não conseguiram curá-la com a fisioterapia. Além de gastos com hotel e presentes, ela comprou uma vela em formato de pé para deixar na Sala das Promessas, uma forma de mostrar sua devoção e a fé de que seu pedido será atendido.
— Vim pedir para que Nossa Senhora cure meu pé e abençoe minha família — disse ela, estimando ter gasto ao menos R$ 1 mil na viagem.
Outro tipo de turista é o que está de passagem pela Rodovia Presidente Dutra e faz uma visita atraído pela grandiosidade da Basílica, a segunda maior do mundo, atrás apenas da de São Pedro, em Roma. A família do motorista Osmi Nunes, de 34 anos, voltava de férias no Rio e parou para visitar o Santuário e admirar a imagem de Nossa Senhora. Em pouco mais de uma hora, seu gasto chegou a R$ 120, com almoço e estacionamento.
A Basílica está deixando de ser a única construção que chama a atenção de quem passa por Aparecida. A própria igreja católica inaugurou, em 2012, o Hotel Rainha do Brasil, uma torre de 15 andares com 330 apartamentos e capacidade para quase mil pessoas, com investimento estimado em R$ 60 milhões.
— Temos 200 hotéis e pousadas legalizados, com CNPJ. Mas há outros 140 ilegais, que abrem entre sexta e domingo apenas para receber os romeiros — conta Ernesto Elache, presidente do Sindicato dos Hotéis e Restaurantes da cidade.
Para 2017, ano em que se completam 300 anos da descoberta da imagem da santa por três pescadores no Rio Paraíba do Sul, a cidade deve bater seu recorde de visitantes. Estima-se que 14 milhões de fiéis irão a Aparecida ao longo do ano. Ate lá, diz Elache, a oferta de leitos deve subir dos atuais 36 mil para 40 mil, mas ele estima que esse número seja insuficiente para atender a todos os visitantes.
Aparecida prepara-se para ganhar seu primeiro shopping, no trevo de entrada da cidade. Trata-se de investimento privado num terreno de 170 mil metros quadrados cedido pela igreja. Calcula-se que serão gastos R$ 400 milhões na construção, que inclui cinco hotéis, além de uma roda gigante semelhante à London Eye, de Londres. A ideia é que uma passarela ligue o complexo ao Santuário, e 80% das obras devem estar concluídas até julho de 2017.

Círio de Nazaré: 2 milhões de fiéis por ano

BRASÍLIA - Uma das maiores festas religiosas do país, o Círio de Nazaré reúne, todos os anos, até 2 milhões de pessoas em um trajeto de 3,6 quilômetros em Belém, no Pará. A festa em homenagem à Nossa Senhora de Nazaré é iniciada no segundo domingo de outubro, quando a procissão sai da Catedral de Belém e segue até a Praça Santuário de Nazaré, onde a imagem da Virgem fica exposta durante 15 dias. A estimativa da Secretaria de Turismo de Belém é de que 85 mil turistas participaram do festejo no ano passado e movimentaram o equivalente a US$ 30,4 milhões, ou cerca de R$ 1.400 por pessoa.
Além de Belém, a procissão se estende a outras cidades do interior do estado. Por isso, muitos dos vendedores ambulantes seguem um extenso calendário e percorrem várias cidades vendendo produtos religiosos em diferentes círios. A cidade de Bragança, por exemplo, recebe milhares de turistas durante o ano não só pela festa em devoção à Virgem, mas também pela Marujada, em devoção a São Benedito. Nessa época, o município de 124 mil habitantes chega a receber 80 mil pessoas.



Nova Trento, reduto da primeira santa brasileira.

BRASÍLIA - Reduto da primeira santa brasileira, Santa Paulina, Nova Trento, no interior do estado de Santa Catarina, recebe, todos os anos, cerca de 840 mil turistas religiosos. A cidade de apenas 13 mil habitantes localizada a 80 quilômetros da capital Florianópolis fica inchada de pessoas que querem pedir e agradecer as graças concedidas pela santa canonizada em 2002 e que viveu uma vida de ajuda a ex-escravos, órfãos e índigenas.
– Em alguns fins de semana recebemos de 15 mil a 18 mil pessoas na região dos santuários. É uma cidade inteira dentro de um único bairro de Nova Trento, explica o secretário de turismo da cidade, Eluísio Voltoni.
Ele conta que a maior parte dos turistas vem da própria região e dos estados vizinhos. Por isso, geralmente, o visitante de Nova Trento não costuma se hospedar na cidade e volta no mesmo dia para o município de origem. Mesmo assim, o local conta com uma estrutura de 550 leitos que está em ascensão, garante Voltoni. Além disso, uma rede de quase 20 restaurantes e 1000 empregos diretos e indiretos supre os turistas durante o passeio.
A estimativa da prefeitura é de que cada um deixe por dia na cidade cerca de R$ 40, o equivalente a R$ 33,6 milhões todos os anos. Nova Trento fica em uma região conhecida pelo forte apelo religioso. Tanto que, em um raio de 40 quilômetros é possível visitar quatro santuários. Além dos dois construídos na cidade, há outros dois templos nas cidades vizinhas, Angelina e Brusque.
O secretário de turismo de Nova Trento explica que, além do apelo religioso, os turistas aproveitam para curtir a gastronomia e o vinho local.
– As pessoas visitam o santuário, pedem, agradecem, pagam suas promessas e depois aproveitam o polo gastronômico da cidade. Isso atrai muitas pessoas não só da região, mas turistas que estão nas praias da região.

PIB de municípios cresce mais do que o do Brasil

APARECIDA (SP), JUAZEIRO DO NORTE (CE), TRINDADE (GO) - Para receber os turistas da fé, vários municípios brasileiros desenvolveram suas economias e têm hoje uma elaborada rede de serviços. Um levantamento do GLOBO com dados do IBGE mostra que as grandes cidades do turismo religioso no Brasil tiveram avanço econômico muito superior ao do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Entre 2000 e 2013 (último dado disponível) o PIB de Aparecida, no interior de São Paulo, avançou 368,7%, e o de Juazeiro do Norte, no Ceará, 579,5% (a preços correntes). Nesse período, a economia brasileira cresceu 329%.
Em Abadiânia, a cidade goiana que abriga o médium João Teixeira de Faria, o João de Deus, o PIB cresceu mais do que o dobro da economia brasileira, 773%. O diretor de Estudos Econômicos e Pesquisas do Ministério do Turismo, José Francisco, explica que o turismo religioso tem decolado, nos últimos anos, na medida em que o avanço da classe média incorporou novos indivíduos ao turismo doméstico:
— A tendência é que ele cresça. Temos festas muito grandiosas. Na Semana Santa, por exemplo, há muito fluxo para essas cidades.
O turismo católico ainda é o que mais movimenta pessoas no país, acompanhando o perfil nacional. Hoje, 64,6% da população são seguidores da religião do Vaticano, segundo o último Censo. Com a predominância católica, o Brasil tem romarias enormes, que movimentam milhões de pessoas por todo o território. Para alimentar e hospedar tanta gente, essas cidades têm redes extensas de hotelaria e comércio. Todos os anos, elas se preparam para receber os turistas, que chegam dispostos a gastar. Em Aparecida, símbolo maior do turismo religioso no país, cada turista deixa, em média, R$ 1.200 por visita, segundo o Ministério do Turismo. Isso equivale a uma injeção de cerca de R$ 12 bilhões todos os anos.
Para suprir as necessidades do turista, os comerciantes estocam centenas de quilos de comida e bebida. Eles vão além da alimentação e da hospedagem. O comércio de imagens, terços, água fluidificada, livros espíritas, cristais energizados faz girar a economia desses municípios. Afinal, não há quem passe pela experiência transcendental sem levar para casa uma lembrança do padre, do santo ou do médium.

MUITO TURISMO, POUCO EFEITO NA ARRECADAÇÃO
Manuseando contas das mais diferentes cores e materiais, o fabricante de terços Wallison Fernandes, 20 anos, diz, da salinha de poucos metros quadrados no meio de uma das principais praças de Juazeiro, que chega a vender mil terços em uma boa romaria. Os objetos custam entre R$ 1 e R$ 5, mas muitos só são vendidos por atacado, acima de uma dúzia.
Com a economia baseada no turismo, essas cidades têm boa parte do PIB sustentada pelo setor de serviços. Em Aparecida, esse segmento representa quase 68% da economia. Em Juazeiro, 59%; em Abadiânia, 42%; e em Trindade, 37%. Em Palmelo, o prefeito Antônio Rezende explica que, por conta do código tributário defasado da cidade, as pousadas não pagam os impostos necessários, ou seja, o turismo não se traduz em arrecadação para a prefeitura local. Com grande parte do comércio e do setor hoteleiro informais, o segmento de serviços representa 30% do PIB local. Mesmo assim, não há qualquer projeto municipal em andamento para regularizar a situação.
O enorme fluxo de pessoas, no entanto, gera, além do bônus do incremento no caixa, um ônus para essas cidades. O prefeito de Abadiânia, Wilmar Arantes, explica que a prefeitura tem de dar atenção especial à rua em que está localizada a casa espírita Dom Inácio de Loyola, onde João de Deus atende cerca de 5 mil pessoas por semana:
— Temos um acordo com a casa de fornecer segurança, viaturas todos os dias. Temos que ficar de olho ainda na qualidade do asfalto e na acessibilidade, porque o número de cadeirantes que vem à cidade é muito maior do que a média de outras cidades deste tamanho.

Romarias de pedidos e agradecimentos

JUAZEIRO DO NORTE (CE) E TRINDADE (GO) - Todos os anos, Iolanda Alves, de 50 anos, prepara o restaurante em frente à principal igreja de Juazeiro do Norte, no Ceará, para receber os romeiros que chegam à cidade. Anualmente, o município recebe o equivalente a oito vezes a população local, de 300 mil habitantes. Cerca de 2,5 milhões de pessoas invadem a cidade para pedir e agradecer os milagres atendidos por Padre Cícero Romão, o que equivale a quase 7.000 pessoas por dia. A maior parte do fluxo é concentrada nas épocas de romaria: ao todo, são quatro ocasiões no ano em que Juazeiro para por cerca de cinco dias. A prefeitura estima que essas pessoas deixem, só no comércio, R$ 375 milhões por ano, ou R$ 150 por visita.
Iolanda inicia o estoque semanas antes: para uma romaria de cinco dias, chega a encomendar 500 quilos de inhame, cem quilos de aipim e um bode inteiro. O faturamento é alto. Ela calcula que, durante a festa, consegue tirar entre R$ 4.000 e R$ 5.000 por dia, 900% a mais que os R$ 500 faturados na baixa temporada. Além dos comerciantes locais, muitos vendedores chegam de outras partes do Nordeste para tentar faturar no período das romarias. A prefeitura calcula que 3.000 ambulantes circulem pela cidade nesses dias.
A movimentação de peregrinos e turistas observada em Juazeiro se repete em centenas de outras cidades. O Brasil é um país de católicos: quase sete em cada dez brasileiros dizem ser seguidores da religião. No estado de Goiás, Trindade ganhou fama pela devoção ao Divino Pai Eterno. A prefeitura calcula que a cidade receba cerca de 3 milhões de pessoas por ano, 25 vezes a população local, de 120 mil habitantes.
— Nos dias de festa, em junho, recebemos milhões, mas todas as semanas temos uma população flutuante de 30 mil a 40 mil turistas — conta o prefeito Jânio Darrot, que estima que existam hoje na cidade 150 hotéis e uma centena de restaurantes.

PROFUSÃO DE SANTOS EM NOMES DE RUAS E POUSADAS

Trinta dias antes da festa do Divino Pai Eterno, os comerciantes estocam bebida e comida. Dono de um restaurante, Cléber Paulo calcula que, só no domingo de romaria, fature 500% mais do que em todo um fim de semana fora de temporada, cerca de R$ 5 mil. Ele conta que, para suportar a demanda, contrata seis funcionários a mais.
— A festa é o décimo terceiro salário do comerciante — conta Cléber.
Tanto Trindade quanto Juazeiro respiram catolicismo. Para nomear as ruas e pousadas, não há santos suficientes. Santo André, Santa Helena, Santa Maria, São José: todos eles emprestam seus nomes para hospedarias. A prefeitura calcula que existem 3 mil leitos.
— Juazeiro se alegra com os romeiros: as pousadas ficam cheias, os comerciantes se espalham pelas ruas — diz Lis Pinheiro, dona da pousada Santo André, o Apóstolo.
Lis conta que nem mesmo havia terminado a obra da pousada, em outubro de 2014, e já estava com todos os 17 quartos alugados para a romaria de Finados. Nessa época, ela explica que cobra R$ 150 por quarto individual. Ou seja, com todas as unidades ocupadas, o hotel fatura mais de R$ 10 mil reais em cinco dias de festejo.
De origem simples, os romeiros têm a fé como último recurso a que podem recorrer. Eles pedem chuva, cura ou agradecem alguma graça concedida. Em Juazeiro do Norte, mais de nove salas guardam, nas paredes, esculturas de mãos, pés e bustos de pessoas que tiveram pedidos atendidos. No local, há todo tipo de objeto que remeta à graça concedida: diplomas, vestidos de noiva, fotos e roupas de recém-nascidos.

A PÉ, DE AVIÃO OU CARRO DE BOI
Para chegar às cidades católicas, os devotos usam todos os meios de transporte: vão de avião, ônibus, carro, a pé e até de carro de boi. Para chegar a Trindade, por exemplo, milhares percorrem andando os cerca de 20 quilômetros que separam a capital, Goiânia, da cidade. O governo do estado chegou a construir, nesse trecho, uma via só para pedestres. Muitos, no entanto, fazem sacrifícios ainda maiores e viajam vários dias ou semanas para chegarem ao município. Aos 63 anos, Dinoraci da Silva já contabiliza 27 anos de romarias a Trindade. Ela percorre a pé os 130 quilômetros que separam a cidade do Divino Pai Eterno do município onde vive, Edéia, também no interior de Goiás. São quatro dias de viagem. Os primeiros sete anos de romarias, conta, foram para pagar uma promessa: a filha, que tinha um linfoma na cabeça, foi curada.
Mantendo a tradição, vários fazendeiros da região fazem uma peregrinação inusitada. Todos os anos, cerca de 300 carros de bois chegam a Trindade. Um dos maiores grupos, localizado na cidade de Orizona, a 160 quilômetros de Trindade, já chegou a participar com 20 carros. Em respeito ao limite físico dos animais — até 12 por veículo —, a viagem é feita em 13 dias. Os romeiros andam ao lado dos bois, pagando a promessa, e se abrigam em fazendas pelo caminho.
Inspirados pela fé, o comércio de imagens e terços vende como nunca. Em Juazeiro, não há quem vá embora sem uma imagem do Padre Cícero. A cidade tem dezenas de artesãos que fazem surgir, da madeira, a silhueta do Santo do Povo. Adalberto da Silva conta que passa até três dias fazendo uma escultura de 50 centímetros. Ele não sabe quantas peças vende em uma época de romaria, mas é categórico: tudo que faz, sai. A determinação de levar uma lembrança para a estante de casa permite que o comércio local sempre fature, conta a comerciante Iolanda:
— O romeiro diz que quem vem para Juazeiro não pode voltar com nenhum centavo. Eles querem fazer prosperar a terra do “Padim Ciço”.

PADRE CÍCERO: PERDÃO DA IGREJA

No fim do ano passado, a Igreja Católica perdoou e reabilitou o Padre Cícero. Ele foi afastado após um episódio, em 1889, conhecido como “milagre da hóstia”. Na ocasião, a hóstia dada à beata Maria de Araújo virou sangue na boca da devota. “Em 1889 houve a primeira romaria. De lá pra cá, nunca mais parou de chegar gente”, explica a secretária de turismo e romaria de Juazeiro do Norte, Marli Bezerra. Como a Igreja não conseguiu comprovar o milagre, o padre foi proibido de confessar e realizar sacramentos. Mais à frente, já aos 90 anos, ele foi definitivamente expulso. A veneração por “Padim Ciço” não esmoreceu apesar da decisão da Igreja. Padre Cícero ficou conhecido como o Santo do Povo, ou o Santo do Nordeste. “O nordestino diz que quem tem que ser perdoada é a Igreja e não o padre”, diz Marli. Fonte: http://oglobo.globo.com

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

CRÔNICA: Era uma vez um Ano Eleitoral.

Frei Petrônio de Miranda, Padre Carmelita e Jornalista. Convento do Carmo da Lapa, Rio de Janeiro. Eleição Municipal 2016.
Contatos: Site: www.olharjornalitico.com.br;

Era uma vez um Ano Eleitoral, onde candidatos e candidatas prometiam fazer milagres para resolver todos os problemas daquela pobre cidade. Por sua vez, muitos eleitores se deixaram seduzir pelas promessas faraônicas e, fascinados pela oratória dos maquiavélicos políticos, acabaram votando nas promessas “sem pé e sem cabeça”. Mas a Eleição passou, e agora José?
Era uma vez um Ano Eleitoral, onde os candidatos e candidatas fizeram “das tripas o coração”, para conseguir o precioso voto. Mais uma vez, fizeram promessas que até os santos duvidaram. Alguns prometeram estrada novinha em folha, outros, aumentar o salário dos professores, outros ainda prometeram emprego, segurança pública. Outros, juraram de pé juntos que, se eleitos fossem, a zona rural teria água e a chamada seca verde estaria com os dias contados. Já outros, juraram perante Deus e o povo que, se necessário fosse, daria um pulinho até Brasília para defender os pobres que nunca tiveram ao longo de décadas, apoio de tais políticos. Mas a Eleição passou, e agora José?
Era uma vez um Ano Eleitoral recheado de números, de cores e de disse que me disse. “A cidade saiu ganhando”? Sim, ganharam as gráficas com as plotagens, ganharam as rádios e os jornais com os anúncios dos “santos candidatos e candidatas”, ganharam os cabos eleitorais que, enfrentando o sol e aos gritos, sustentavam as bandeiras partidárias em nossas pontes e ruas, ganharam os pequenos empresários de carro de som, ganharam os empresários de fogos, ganharam alguns radialistas e jornalistas que viraram garoto propaganda de alguns candidatos, ganharam vários moto taxistas e motoristas através das carreatas intermináveis, com o único objetivo de mostrar o poder econômico, a força política e assim, coagir o voto dos pobres que se deixaram levar pela emoção e fanatismo político. Mas a Eleição passou, e agora José?   
Era uma vez um ano eleitoral onde a pacata cidade, os sítios e povoados ficaram agitados. Todos se transformavam em pesquisadores, juízes, detetives e comentaristas político. Mas a Eleição passou, e agora José?   
Era uma vez um Ano Eleitoral onde o lobo mau se transformou em cordeiro, a fera e corrupta em bela e santa! O estulto em uma criança inocente e a princesa em Madre Teresa de Calcutá. Os empresários, os fichas sujas e corruptos da política saíram de suas fortificadas mansões e foram abraçar os maltrapilhos pobres e abandonados nos distritos, povoados, sítios, vilas e ruas. Alguns foram mais além chegando a comer  feijoada e sarapatel, um pão de queijo, um açaí na tigela, um pão com linguiça, tomando um gole de cachaça e jamais! Sob hipótese alguma, faltaram à festa do padroeiro, o velório do desconhecido e aquela falsa tapinha nas costas com cara de pecadora arrependida foi a marca registrada! Mas a Eleição passou, e agora José?   
Era uma vez um ano eleitoral, onde todos eram valorizados porque todos votavam. A Madame abraçava os doentes, o advogado ouvia o sem teto, o médico nunca fez tanta consultas em sua profissão. Mas a Eleição passou, e agora José?   
Era uma vez um Ano Eleitoral onde os santos e santas não precisaram se preocupar com os problemas da cidade; a dor de barriga, a enxaqueca, a violência... Não, não! Porque os candidatos das eternas promessas estava de plantão até às 24 horas para resolver os problemas possíveis e impossíveis. Mas a eleição passou, e agora José? 
Era uma vez um Ano Eleitoral, onde algumas beatas esqueceram os ensinamentos de misericórdia e do diálogo, o sacristão confundia o sino com os fogos do seu partido, o padre ficava de “saia justa” diante do assédio dos candidatos e candidatas. Quanta caridade para as comunidades, grupos, associações e movimentos.  Mas a eleição passou, e agora José?   
E agora, o que vamos fazer José? Se não tem eleição, se não tem candidato, se não tem comício, se não tem carreata, se não tem a Madre Teresa de Calcutá para abraçar as crianças, se não tem partido, se não tem propaganda eleitoral, se não tem choro, se não tem fanatismo, se não tem bandeira nas ruas, se não tem carro de som, se não tem velório, se não tem casamento de boneca, se não tem festa de padroeiro com candidatos e candidatas? Se não tem eventos esportivos? O que fazer José!? Há já sei... Vamos aguardar as próximas Eleições para Presidente, Deputado, Senador e Governador porque aí as conversas nas praças e ruas voltarão e os “empresários da política” que não sabem fazer outra coisa, a não ser roubar os votos dos pobres, também continuarão de plantão, enquanto os pobres, as eternas vítimas de sempre, vão permanecer sem água potável, trabalho, segurança, saúde, educação, esporte e lazer. Ah Ah Ah... José! O que fazer José? E agora?...
Convento do Carmo da Lapa, Rio de Janeiro. 9 de agosto-2016. 

ELEIÇÕES-2016: Perguntar não ofende-27.

Audiência Geral com o Papa Francisco