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domingo, 9 de setembro de 2012

A Fraternidade: Um desafio permanente para a vida Carmelitana

Irmã Dazir da Rocha Campos. Congregação das Irmãs Carmelitas da Divina Providência
 
1. A fraternidade é um valor fontal irrenunciável.
Buscando o fundamento de nossa vida fraterna em comunidade, parei meu olhar em Jesus.  Nós escolhemos ser “irmãs”, “irmãos”? Ou ser “irmãs”, “irmãos já é algo que faz parte do nosso ser, da nossa identidade?
Jesus nos disse: “Dou-vos um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros. Como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros. Nisso reconhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13, 34-35). Jesus não nos deu um conselho, uma sugestão. Ele foi bem claro: dou-vos um mandamento. E não disse isso apenas para as religiosas, religiosos e padres. Ele colocou o mandamento do amor como exigência para ser seu discípulo, isto é, para ser cristão/cristã. O amor é, pois, exigência fundamental no cristianismo. E sabemos que Deus não nos pede coisas impossíveis, além das nossas forças.
Ao nos dar o mandamento do amor, Jesus nos pede que busquemos a nossa essência mais profunda. Filhas/filhos do Deus Amor, criadas/os à sua imagem e semelhança, somos feitos para o amor. “O ser humano aspira por amor verdadeiro; por um amor que não fira nem destrua, mas que vivifique e enobreça; que não controle e aprisione, mas liberte e abra um espaço para a vida” (Anselm Grun). O amor não é algo estranho ao nosso ser. E não há nada que possa preencher nossa vida de sentido e alegria fora do amor. Certamente que não se trata do amor puro sentimento que logo desaparece, mas o amor decisão em que se possa permanecer. Como Jesus nos pede: “permanecei no meu amor” (Jo 15, 19). Podemos, pois, fazer do amor o nosso lugar de morada. Só de pensar em morar no amor de Jesus, um profundo sentimento de bem-estar, de realização profunda surge em nosso íntimo. O amor deve ser o nosso modo de ser, de viver, de conviver, porque é parte de nossa essência.
2. Em Jesus encontramos o modelo para o exercício e a construção da Fraternidade.
Volto a fixar meu olhar em Jesus: “Eu quando for elevado da terra, atrairei todos a mim” (Jo 12,32). Antes mesmo de abrir seus braços na cruz, Jesus atraía as pessoas de todos os tipos. Posso imaginá-lo tão acolhedor e aberto que ninguém tinha medo de se aproximar dele. Temos experiências assim, pessoas das quais gostamos de estar perto, porque sua simples presença nos faz sentir bem. Jesus é o próprio Amor, feito homem. Fico pensando naquelas mulheres, que enfrentaram as normas e as restrições de uma sociedade machista, dominada pela lei da pureza, e se aproximaram de Jesus. A mulher Cananéia, aquela que sofria de hemorragia (Lc 8, 43-48), a pecadora que ungiu os pés de Jesus (Lc 7, 36-50)... Todas elas sabiam que seriam acolhidas, que seriam atendidas em suas necessidades.  Jesus não só acolhe aquelas mulheres e as eleva em sua dignidade, ele convida a elas e a todas nós: “permaneçam no meu amor” (Jo 15, 19). O amor de Jesus é mais que um sentimento, é um espaço onde podemos morar. Podemos permanecer no amor de Jesus porque ele foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo (cf. Rm 5, 5). Mas não podemos segurar esse amor em nós como uma posse pessoal exclusiva. Uma característica do amor é ser transitivo. Ele precisa passar, através de nós, para os outros, para a nossa irmã, nosso irmão, que estão tão próximos, que lhes conhecemos as fragilidades, os limites e, por isso nos esquecemos de ver nela/nele uma filha, um filho amado do Pai. A convivência do dia-a-dia pode encobrir o mistério, a beleza presente em cada pessoa. Beleza que só os olhos amorosos conseguem ver.
Se mantivermos nosso olhar fixo em Jesus, se morarmos no seu amor e experimentarmos que somos filhas/os amadas/os do Pai, a fraternidade será a nossa maneira simples e cotidiana de nos relacionarmos. Viveremos a fraternidade, que não significa sermos perfeitas/os nas nossas relações, mas sermos amorosas/os. Fraternidade que cria espaço para a acolhida, para a compreensão, para o perdão. Saberemos discordar, sem rejeitar a pessoa da qual discordamos. Saberemos enxergar os limites, a doença da pessoa, sem deixar de ver o mistério de amor que nela habita. Fraternidade que não mascara a realidade, que não põe “panos quentes”, mas que abraça amorosamente as dores mais profundas, especialmente aquelas que temos mais dificuldade de perceber e aceitar porque não residem no corpo, mas na alma.
3. Perigos que desfiguram a beleza da vida fraterna.
No mundo em que vivemos inúmeros problemas afloram e se multiplicam a cada momento.  O ativismo, o individualismo, o comodismo, a competição, a falta de compromisso, de generosidade, o fechamento, a crise no relacionamento, o uso inadequado dos meios de comunicação, a fuga da vida fraterna e de oração, tudo isso gera conseqüências sérias para a vivência fraterna. Torna-se comum a perda de referência dos valores, a dificuldade de lidar com os próprios limites, a tendência à facilidade, à comodidade e, em meio a tudo isso, a fidelidade se revela como algo pesado demais, às vezes até insuportável. Estaria a VR e a Família Carmelitana da AL imune a tudo isso? É evidente que não. 
Com freqüência perdemos o ardor. Caímos na rotina dos atos comunitários, praticamos uma oração formal e vazia; entregamo-nos à correria das atividades e compromissos de trabalho e, assim, nos esvaziamos, nos fragmentamos, perdendo o contato com a Fonte da Vida. Esquecemos uma Presença e afastamos nosso olhar d’Aquele que é o sentido das nossas atividades e compromissos. A vida se torna pesada, os relacionamentos interpessoais, que deveriam ser marcados pela ternura e gratuidade, ficam duros, cheios de cobranças e acusações. E isso entristece o nosso coração, nossa vida murcha. A nossa presença de consagradas/os perde o valor e a atração. É então que precisamos retomar o caminho, reacender a chama e redescobrir o encanto de nossa vida em suas várias faces. Precisamos parar; aquietar-nos e novamente voltar nosso olhar enamorado para Aquele a quem decidimos seguir e entregar a nossa vida.  Fixar nosso olhar n’Aquele a quem queremos, a cada dia de novo, dar o nosso coração.
4. Acolhendo as exigências permanentes de nossa missão.
Na Conferência de Aparecida, Pe. Pascual Chávez, Superior Geral dos Salesianos, falando em nome dos religiosos, afirmou: “No mundo a vida consagrada tem a missão específica de cultivar uma forte experiência de Deus e aproximar de Deus o homem e a mulher feridos, abandonados à margem do caminho”. Como Carmelitas, sabemos o quanto essa afirmação é verdadeira e toca na raiz de nossa Espiritualidade.
Não viemos ao Carmelo para sermos peritas/os em educação ou enfermagem, em administração, serviço social, ou qualquer outro serviço profissional. Nem, tão pouco, para criar e dirigir colégios, obras sociais ou outras atividades até religiosas. Tudo isso é muito bom e necessário. Podemos fazer esses serviços e devemos fazê-lo bem, mas viemos para algo muito maior. Fomos chamadas(os)  para cultivar uma experiência profunda de intimidade com Jesus Cristo - Deus - que veio ser um de nós, que sofreu, morreu, ressuscitou e está sempre conosco, está em nós. Ele, que deu sua vida por amor, nos chama para estar com Ele a serviço da Vida.
Temos a missão de cultivar uma profunda experiência com Deus em Jesus Cristo. Vamos pensar um pouquinho na palavra cultivar. Sabemos em que consiste cultivar uma horta, um pomar ou um jardim. Quem cuida de uma horta gasta tempo, fazendo coisas muito obvias para que as hortaliças tenham vida e cresçam: regar, tirar o mato, matar as pragas que estão destruindo as verduras. Mas, uma pessoa que ama sua horta ou jardim vai além. Ela descobre e inventa minúcias de cuidado. Contempla o desenvolvimento da planta, conhece cada detalhe que diferencia uma planta de outra e assim, esta pessoa se torna doutora na arte de cultivar.
E nós, como realizamos a missão de cultivar uma profunda experiência de Deus em Jesus Cristo? Nós, Carmelitas, escolhemos ser especialistas na vida de intimidade com nosso Deus. Publicamos essa nossa escolha diante da Igreja e da sociedade. Estamos nos ajudando a abrir espaços para que Ele mais e mais nos transforme e o nosso coração pulse forte só ao lembrarmo-nos sua presença amorosa continuamente conosco? 
Essas são perguntas essenciais. Viemos ao Carmelo para viver uma profunda entrega ao amor de Deus manifestado em Jesus Cristo.  Este Deus, que é todo ternura, compaixão, misericórdia, irá transformando-nos nele, de tal modo, que nós também vamos adquirindo e expressando cada vez mais ternura, compaixão e misericórdia.
5. “Peritos” em fraternidade num mundo sedento de sentido.
Tornamo-nos capazes de assumir o desafio da convivência fraterna dentro e fora da comunidade religiosa. Saberemos fazer das pessoas distantes um próximo(a) e da pessoa próxima uma irmã, um irmão. Assim, a fraternidade profunda, feita de ternura, ajuda, perdão, compreensão, respeito, silêncio e reverência será o fruto saboroso que nós poderemos oferecer ao mundo.
Para isto é que viemos. Oferecer ao mundo, às pessoas sedentas de um sentido mais profundo para suas vidas, a ternura de Deus que, em Jesus Cristo, se fez tão próximo a ponto de ser um de nós, tão igual que passa despercebido. E nós que, no silêncio e escuta, na abertura do nosso coração gastamos tempo diante d’Ele, deixamos que Ele penetre com sua vida e seu amor todos os meandros da nossa emoção, da nossa inteligência e da nossa vontade. Nós cultivamos uma sensibilidade na fé a ponto de podermos dizer como São Paulo: “Minha vida presente na carne, eu a vivo pela fé no Filho de Deus que me amou e se entregou a si mesmo por mim.” Aí sim, nossa vida pessoal, nossa vida comunitária e tudo o que fizermos será um anúncio vivo da boa nova de Jesus: Temos um Pai que nos ama e o seu amor dá sentido e consistência a cada momento da nossa vida.
Experimentaremos a alegria imensa que vem do amor vivido nas situações mais concretas da vida. Vamos deixar o amor fluir em nós, transbordar para cada irmã, cada irmão, para cada pessoa que nos toca com sua presença.
 
Questionamento para trabalho em grupo:
Sabemos o que é uma “família” bem constituída.
 
1-Aqui na AL que desafios percebemos para que a Família Carmelitana seja de fato transparente, dialogal e comprometida com o reino? Como superá-los?
 
2-Enumere pontos concretos em que crescemos ou regredimos em nosso nossa vivência como FAMÍLIA.
 
3-A fraternidade, a vida de oração e a missão são elementos fundamentais no Carmelo.
 
4-A partir deste Encontro, que gestos, que atitudes concretas necessitam ser tomadas, a curto e em longo prazo, para o nosso crescimento como Família?

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