Ex-padre,
argentino gay larga a batina e escreve carta ao papa
O
argentino Andrés Gioeni, 41, foi padre durante dois anos e meio em Mendoza até
largar a batina e assumir ser gay. Ator, diretor e escritor de peças infantis,
vive em San Isidro, na Grande Buenos Aires, com seu companheiro, Luís, há nove
anos e meio. Na semana passada, ele escreveu carta aberta ao papa Francisco
pedindo que ele ajude aos gays a "transitar pela fé" sem renunciar à
"experiência do amor".
*
Na
infância, estudei em um colégio religioso, marista. E dizia: nunca na minha
vida vou ser sacerdote, não queria aquilo. Minha família era católica, mas não
religiosa. Comecei a participar de um grupo missionário e começamos a fazer
trabalhos voluntários num bairro pobre de Mendoza [a 1.100 km de Buenos Aires].
Na
época, eu namorava uma menina, Carmem, e tínhamos o plano de nos casarmos e
virarmos missionários na África. Nesse
bairro, as pessoas me falavam que faltava um padre. Eu estava estudando para
tentar a faculdade de medicina, aí resolvi ir para o seminário. Quando
entramos, éramos 12 seminaristas e só quatro se tornaram sacerdotes. Desses
quatro, só um ainda é padre.
Fiquei
oito anos no seminário. Não me sentia sozinho, tinha uma família lá. Foi mais
difícil quando virei sacerdote, aos 27. Vi que não era tão fácil, tinha muitas
responsabilidades, ficava sozinho. Mas gostava de celebrar a missa. Aí
comecei a me dar conta do que estava acontecendo: algo que não era, para mim,
natural. Eu me condenava.
No
seminário, a questão da homossexualidade só era tratada em algumas aulas. No
dia a dia, era um tabu. Olhando
agora para trás, vejo que no seminário já sabia [que era gay], mas eu negava.
Se
percebia que estava gostando de algum companheiro, logo me reprimia, falava a
mim mesmo: "O que está acontecendo? Está louco?."
Dois
seminaristas fizeram insinuações pra mim, queriam me namorar. Eu achava que
fosse loucura,negava aquilo. Eles saíram do seminário, eu fiquei. Me dei conta
de que era gay mesmo quando já era sacerdote.
Gostava
de entrar em salas gay de bate-papo como anônimo. Depois, me arrependia, dizia
que nunca mais faria aquilo. Um dia, encontrei um homem que conheci no chat. Conversamos
durante umas cinco horas e não contei que era padre. Acabamos tendo relações
sexuais.
Foi
uma experiência linda, mas, no outro dia, acreditava que estava no inferno, que
era a pessoa mais pecadora do mundo. Comecei a rezar, chorei muito e fui me
confessar sem dizer que era padre. Falei: "Basta, isso vai passar, não
pode mais acontecer".
E
não passou. E passei a me perguntar se era algo transitório ou para a vida.
Quando me dei conta que era para a vida, cortei laços com a igreja.
Vim
para Buenos Aires começar uma nova vida. Uma pessoa me chamou para fazer umas
fotos nu para uma revista gay. Depois, trabalhei por um ano de garçom numa
boate gay. Foi muito difícil me aceitar. Por 30 anos, recebi a informação de
que isso que eu vivia -ser gay- não era bem visto aos olhos de Deus.
Depois,
comecei a me dar conta de que Deus não é assim. Ele segue me amando e
acompanhando, não importa que eu seja homossexual. Há
nove anos e meio vivo com Luís. Queremos nos casar oficialmente. Mas adotar um
filho não está nos planos.
Sigo
acreditando em Deus, não no da igreja, que tem tantas leis. Fiquei feliz quando
Francisco virou papa, uma pessoa mais aberta. Quando ouvi suas palavras na
viagem de volta do Rio, resolvi que era a hora de escrever para ele. Publiquei
o texto no Facebook e pedi para amigos compartilharem e me ajudarem a fazer
chegar a ele a carta.
O
catecismo não pode seguir dizendo que um gay é uma aberração. Sei que mudanças
não virão de hoje pra amanhã. Mas espero que, daqui a 30 anos, um menino possa
dizer sem medo que é homossexual.
Fonte:
www.uol.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário