(Os dados que seguem foram colhidos em dois livros do
Pe.Balbino Velasco Bayón O.Carm.: "MIGUEL DE LA FUENTE O. CARM.
(1573-1625) - ensayo critico sobre su vida e su obra" - (Roma 1970), e um resumo deste: "VIDA DEL VENERABLE
P.MIGUEL DE LA FUENTE" (Valdelaguna
1990). Consultamos também "LAS TRES VIDAS DEL HOMBRE" do
próprio Pe.Miguel - Ediciones Carmelitanas - Madri 1959, edição do Pe.Garrido O.Carm.)
VALDELAGUNA
Miguel de la Fuente nasceu na
Espanha, a uns 50km de Madri, em Valdelaguna, apenas um pequeno povoado, que na
sua tranqüilidade vivia da agricultura e da criação dos seus rebanhos. Como
ainda, hoje os seus habitantes eram
gente simples,mas católicos sinceros, fervorosos, capazes de transmitir fé e
fibra e bons exemplos.
Assim foram os seus pais, Francisco
de la Fuente e Da.Catarina Fernández, de quem nasceu no dia 2 de março de 1573.
Francisco foi alcaide e corregedor. Alguém testemunhou: "Foram os seus
pais mui servos de Deus e, em particular, Francisco de la Fuente era de tanta
virtude e tão humilde que levava carne às viúvas e pobres caridosamente e
defendia pobres e viúvas com grande caridade, porque a sua caridade era
notável".
Cinco, ao menos, foram os irmãos de
Miguel, e o mais velho, chamado João, foi carmelita como Miguel bem mais tarde.
A sua infância e adolescência foram felizes na sua pobreza; como os meninos da
sua idade já freqüentava a escola,ajudava à missa e gostava mesmo de ensinar a
doutrina aos mais pequenos.
MADRI
Aos 15 ou 16 anos foi a Madri, para
estudar Gramática no Colégio dos Jesuítas que, além de lhe ensinar gramática,
latim e castelhano, composição e declamação, cultivaram principalmente a sua fé
e piedade e estimularam a sua devoção maior para com Maria, Mãe de Deus,
convidando-o a entrar para a Congregação Mariana e dedicar-se ao apostolado
entre os jovens como bom congregado de Nossa Senhora. Haveria isto de ajudá-lo
muito, mais tarde.
VALDEMORO
Depois de terminar os estudos em
Madri, Miguel pediu a sua entrada para os Carmelitas de Valdemoro, onde vivia
já o seu irmão João; era um convento, que "estava em estritíssima
observância, contínua oração e coro
dia e noite"
Ótima foi a sua formação carmelita,
de acordo com a Regra de Santo Alberto de Jerusalém e o Livro da "Instituição
dos Primeiros Monges", bases da espiritualidade do Carmelo e auxílio
inestimável para Miguel na continuidade da vida ascética e mística e na sua
Pastoral de escritor e diretor de almas. Fez a Profissão Religiosa no dia 29 de
março de 1594 dentro dos seus 21 anos de idade.
SALAMANCA
De Valdemoro foi enviado para
Salamanca e na Universidade fez os seus estudos de Artes e Teologia. O convento
era de boa e rigorosa observância. Teve ótimos mestres, entre os quais o
carmelita Bartolomeu Sánchez, catedrático de Lógica Maior, e o dominicano
famoso, Domingos Báñez. Em casa estudava os autores da Ordem. Mas o ambiente
universitário não contribuiu muito para o seu progresso espiritual, pelo menos
por aqueles dias; como aluno, porém, foi muito aplicado, pois tornou-se
excelente e bem aproveitado. No curso de 1597-1598, matriculou-se já como
"presbítero-teólogo".
VALLADOLID e ÁVILA
Aos 28 anos de idade encontra-se no
convento de Valladolid como mestre dos estudantes e passante (encarregado de
repetir e "passar" as lições aos mais jovens). Com os mesmos encargos
foi transferido para Ávila em 1603, e se a ciência o havia inchado, Deus aí se
encarregou de murchá-la de uma maneira bem simples: seria um sermão muito
esperado pelo povo e muito bem preparado de acordo com todas as exigências e
regras da retórica; mais ainda, em louvor de Nossa Senhora. Mas perdeu o fio e
foi perdendo as cores e... Triste e abatido retirou-se para a sua cela. Com a
humildade recuperou o fervor antigo; agora é outro ou o mesmo de antigamente.
Quer ser carmelita, quer ser apóstolo dos mais pobres e discriminados.
SÃO PAULO DE LA MORALEJA E SEGÓVIA
Em São Paulo, no primeiro convento
carmelita de Castela, recebe a obrigação de ser pároco de um pobre e pequeno
povoado, onde rememora e reaprende as lições de simplicidade e humildade do seu
Valdelaguna.
Em Segóvia já é a pastoral entre os
noviços, os congregados e... entre as prostitutas, que depois viverá em Toledo
plenamente. Toledo será o campo escolhido por Deus para o seu apostolado desde
1609 até à morte.
TOLEDO
a) apostolado entre meretrizes
Toledo, cidade mourisca, de muitas
mulheres lindas e muitos homens de muita pouca-vergonha. Comovia-se Frei Miguel
com tanta perdição. Já não lhe faltava mais o fio aos seus sermões e freqüentemente
mulheres das zonas vinham procurá-lo
arrependidas e se convertiam. Diz o seu biógrafo que a sua audácia e
atrevimento foram incríveis: se elas não vinham, lá ia ele para o lugar do
trabalho delas, à procura das suas ovelhas desgarradas. A natureza não o fez
bonito e as penitências e jejuns, disciplinas e mortificações da carne, que lhe
haviam tirado o pouco, que restava de beleza, o ajudavam; mais ainda, a oração,
a graça e a confiança na Virgem. Isto, porém, não deixou de lhe custar muitas
calúnias e injúrias, muito espancamento e maus tratos por parte de amantes
ciumentos... e talvez a própria canonização. Não esmoreceu, porque os frutos e
a consolação vinham vindo e elas também; com dificuldades no início; e eram
recolhidas nas moradas das beatas do Carmo que, a princípio renitentes, com ele
procuravam para elas trabalho honroso, sustento, animação e até mesmo entrada
para a vida religiosa. Escutem o testemunho de uma delas: "Por ter esta
testemunha na sua fraqueza e pouca idade caído na miséria de estar na casa
pública, este Servo de Deus, vendo-a tão criança, que seria coisa de 15 anos,
disse-lhe com muito amor que fosse vê-lo no Carmo". Com muito custo ela
foi e ele lhe deu a absolvição e a consolou, dando lhe apenas uma penitência
pequena em honra de Nossa Senhora do Bom Parto, que as mais pesadas ele faria
por ela. Esta chamava-se Antônia da Penha e depois se fez freira de clausura
com o nome de Teresa de Jesus.
O cozinheiro do convento, o
sacristão das clarissas, já certamente mais idosos, mas um tanto envergonhados,
todos deviam ajudá-lo: eram exigências do Amor.
b) entre os noviços e almas piedosas
O nosso Convento de Toledo bem
conhecido de São João da Cruz - ao menos numa parte - estava num ponto muito
bonito, ás margens do Tejo, e era habitado por uns 60 religiosos. Frei Miguel
foi logo encarregado da formação dos noviços: rigoroso consigo, foi muito
compreensivo com os seus jovens, que o amavam e nele confiavam. Dizia um:
"Só com três dias de práticas, que fazia e mandava, todos se achavam tão
contentes por prosseguir naquela vida espiritual, que claramente se reconhecia
o dom de magistério, que ele tinha de Deus". Isto não impedia que fosse
firme nos princípios e nas exigências. Foi por dez anos formador das gerações
dos excelentes religiosos carmelitas do século XVII.
Pessoas ansiosas por uma vida
espiritual mais profunda o procuravam: padres, religiosas de clausura,
recolhidas e beatas. A Bem-Aventurada Maria de Jesus, carmelita descalça
chamada por Santa Teresa de Jesus "meu letradinho", foi dirigida por
ele. É dela este testemunho do ano de 1631:
"Havia como dez anos, pouco mais ou menos, que de ouvido teve
notícias do grande padre Frei Miguel de la Fuente da Ordem de Nossa Senhora do
Carmo, que tinha tanta fama de santidade e virtude que desejava dirigir-se com
ele. Veio a este convento, onde teve com ele direção e pareceu-lhe, após a
direção, que era maior a sua virtude e perfeição do que o povo lhe atribuía
(...)". Daí em diante grande amizade e afeto os uniram, como desde o Divino
Mestre aconteceu muitas vezes na história da Igreja, entre irmãos ou não,
quando mulheres santas ansiavam também pelo alimento do coração: São Pedro e
Maria, mãe de João Marcos, a empregada Rosa e a viúva Talita; São Paulo e
tantas santas mulheres por ele lembradas nas suas cartas: Lídia, Prisca ou
Priscila, Síntique, Evódia, Lóide, Eunice, Febe, Júnia, Júlia, Cláudia, Trifosa
e Trifena; o diácono São Filipe e as quatro filhas virgens; Santo Antão e sua
irmã; São Pacômio e Maria, sua irmã; Santa Macrina, a jovem, com a mãe Santa
Amélia e os três irmãos, São Basílio, São Gregório de Nissa e São Pedro de
Sebaste: Macrina (quer dizer Grandinha) ficou nos pés deles até se fazerem
monges; São Cesário de Arles e a sua irmã Santa Cesária; o poeta Venâncio Fortunato
e a rainha Santa Radegundes; Rufino e Santa Melânia, a antiga; o bispo Donato,
monge de São Columbano e a própria mãe, Santa Flávia; Santo Ambrósio e sua
irmã, Santa Marcelina; São Jerônimo e a santa mulher Paula com as filhas santas
virgens Leta e Eustóquia; Santo Agostinho e Santa Perpétua, sua irmã; São Bento
com a mãe de leite e a irmã, Santa Escolástica; São Francisco de Assis e Santa
Clara; São Domingos, a Beata Joana de Aza, sua mãe e a irmã, que lhe deu três
filhos para a Ordem, e ainda as irmãs do Mosteiro de Prula (Tolosa) e do
Convento de Santa Sabina (Roma); o Beato João Soreth e a Beata Francisca de
Ambósia, duquesa da Bretanha; Beato João Batista da Conceição e Madre Francisca
Romero; São João da Cruz e Santa Teresa de Jesus; São Francisco de Sales e
Santa Joana Francisca de Chantal; São Vicente e Santa Luísa de Marillac Le
Gras; o Ven. Miguel de Santo Agostinho e a Ven. Maria de Santa Teresa Petit;
São João Bosco e Santa Domingas Mazzarello; o Pe.Lourenço e Madre Crucifixa; e
só Deus sabe quantos outros pares santos Ele uniu no amor a Jesus Crucificado e
à Igreja, a Esposa, que o seu Filho veio conquistar, purificar e redimir,
banhando-a com o batismo da água e da palavra.
Voltando ao nosso Pe.Miguel de la
Fuente, é interessante observar que ele, como São João da Cruz, gostava de
mandar bilhetes e apontamentos aos seus dirigidos, padres ou religiosas e até
mesmo convertidas, animando a todos, ensinando-os a rezar e suprindo assim a
sua ausência.
c) no meio rural - Confrarias do Carmo
Foi um apostolado gratificante para
o seu espírito e para o seu coração amante dos pobres e simples, mas pesado
para o seu corpo fraco e sem saúde. Foi dispensado do seu ofício de Mestre de
Noviços, mas não se dispensou deste apostolado nos "Montes de
Toledo", isto é, no meio da população campestre. Os meios empregados, além
da oração e costumeiras penitências pessoais, foram a pregação dos mistérios da
Paixão e Morte do Senhor e das verdades fundamentais da nossa fé, assim como a
Consagração a Nossa Senhora por meio do santo escapulário. Semeou de Confrarias
do Carmo o chão das províncias de Toledo, Madri, Badajoz e Cidade Real.
Ele que sempre procurou reconhecer
as exigências dos homens do campo, respeitando os seus horários e as situações
melhores para eles, caminhando de choupana e choupana, escolheu a devoção do
escapulário, por ser mais simples e compreensível e de prática acessível: amor
à Mãe de Deus e uso da sua veste por amor. Para as Confrarias escreveu o
"Compêndio historial de Nossa Senhora do Carmo" e procurou um estilo
bem claro para afastar qualquer tipo de superstição: o que é preciso é fuga do
pecado, para não padecer o fogo eterno, correspondência aos merecimentos da
Sagrada Vida, Paixão e Morte do Redentor, às dores, lágrimas e intercessão da
Virgem, Mãe do Nosso Deus e Senhor Jesus Cristo e ao valor dos sacramentos, das
indulgências e da tão confortadora Comunhão dos Santos. O Sábado do Céu é o
Descanso Eterno do Senhor Deus e abraça qualquer dia das semanas desta nossa
terra: com o seu carinho de mãe Maria há de conseguir que lá, quanto antes,
mergulhem todos depois da morte.
Não lhe faltaram injúrias de pessoas
maldosas nem injúrias do tempo: "grandes calores e sóis", "tempo
mui terrível de águas e frios", e "neves" e "chuva sem
parar durante noites inteiras", noites sem dormir e dias sem comer; perdas
pelos caminhos, "caminhos ásperos e compridos", queda dos cavalos,
pousadas e vendas superdesconfortáveis e brincadeiras bobas de bêbedos. E sede.
Muita sede até! Este é o universitário de Salamanca... sedento da salvação dos
pobres camponeses a distancias da grande cidade.
c) Terceiros e Beatas Carmelitas
Preocupando-se com as Confrarias do
Escapulário, Pe.Miguel preocupou-se também com as Ordens Terceiras e a instituição
das Beatas Carmelitas: tudo o que puxasse para perto de Nossa Senhora do Carmo.
Digamos assim: muitíssimos beatérios e ordens terceiras foram fundados por ele.
Clérigos, leigos, mulheres e homens pediam o hábito de terceiros carmelitas.
Fala-se de 400 a 500 numa cidade e de 600 em outra. Como a estas pessoas se
pedia um vida mais dedicada à oração e vida espiritual, Pe.Miguel as
acompanhava de perto ou de longe, pessoalmente ou com a ajuda de outros
sacerdotes; compôs para elas um livro,
que chamou de "Regra e modo de vida dos Irmãos Terceiros e Beatas de Nossa
Senhora do Carmo" e um complemento deste com o nome de "Exercícios de
Oração Mental".
Explica-lhes como concordam e como
diferem as várias maneiras de ser carmelitas: frades, freiras, terceiros e
beatas, além dos simples leigos e confrades. Freiras e frades fazem os três
votos de castidade, pobreza e obediência; as beatas, principalmente virgens e
solteiras, fazem os dois votos de castidade e obediência, e os terceiros,
casados ou não, professam castidade segundo o seu estado, de acordo com o 6º
mandamento e até podem fazer o voto sob conselho do confessor. Insiste sobre a
freqüência dos sacramentos, jejum e abstinência, oração mental e prática de
mortificações voluntárias, caridade para com os irmãos, principalmente os
doentes e os defuntos, e recolhimento: de maneira especial, por parte do sexo
feminino.
Porque deve cada carmelita
"meditar dia e noite na lei do Senhor", ele apresenta um
"Exercício para durante o dia" e outro "Exercício para durante a
noite". Insiste sobre as aspirações de amor e até compôs, como era moda,
um ABC para suscitá-las:
Amor imenso, abrasa-me no teu fogo.
Bem meu, penetra minhas entranhas.
Concede-me morrer por te amar.
Desnuda-me de todo amor terreno.
Embriaga minha alma com tua graça.
Força de amor, transforma-me em ti.
Gozo inefável, sejas gozo em mim.
Hás de ferir-me com teu amor, Amado
meu.
Inflama-me
de modo a todo me abrasares.
Juntos fiquemos num vínculo
indissolúvel.
Lança-me a força do teu amor, que todo
me abrase.
Minha alma, absorta em ti, esqueça-se
de si.
Nada mais quero senão amar-te.
Oh! Se intimamente a ti tu me unisses!
Penetra-me com um amor suave.
Quisera amar-te sem nem um pouco
cessar.
Recolhe-me, ó meu Bem, nestes teus
braços.
Sol divino, ilumina-me e eu te
enxergarei.
Transforma-me em ti agora e
descansarei.
Une-me a ti com laços de amor.
Vivo ou morto todo teu serei.
Zelo meu será amar-te e não viver.
d) Congregação de Nossa Senhora do Carmo
Vimos como na juventude, entre seus
15 ou 16 anos até os 21, Miguel de la Fuente inscreveu-se na Congregação
Mariana do Colégio dos Jesuítas de Madri e freqüentou-a com muito amor e
fidelidade. Agora que é Carmelita todo de Maria e Diretor espiritual muito
procurado, funda a sua Congregação de Nossa Senhora do Carmo, certamente
inspirado pela outra. Para a sua escreve um pequeno livro: "Ordenanças e
modo de se governarem os irmãos da Congregação de Nossa Senhora do Carmo".
Os seus primeiros congregados eram da Confraria e eram, portanto, um grau entre
terceiros e confrades. A sua insistência recaía sobre a freqüência aos
sacramentos, a devoção a Nossa Senhora, ao seu escapulário e aos mistérios da
Paixão principalmente, para melhor se conformarem com o Cristo sofredor. A
cada congregado se desse no Domingo de Ramos um ramo e um ramalhete espiritual
com um passo da Paixão para ser recordado e meditado durante o ano e ajudar a
viver o propósito de não ofender o Senhor. Um padre, o Pe. Moya, "se
enternecia", ao ver 500 homens de todos os estados e condições,
"desde o mais principal e ilustre de cidade", que baixavam ao
Convento do Carmo com frio, vento e chuva para assistirem à meditação e aos
exercícios mensais de penitência.
Miguel se cuidou da ascese, cuidou
também da maior de todas as asceses, os exercícios da caridade: "atenção
aos doentes, aos presos nas cadeias e qualquer outra prática de assistência
social". "O intento desta santa Congregação é que se exercitem os
irmãos em obras de misericórdia". Os seus congregados muito tiveram de
ajudá-lo no apostolado entre as meretrizes. Era norma, que lhes deu o Padre,
"de noite levar e recolher aos hospitais ou às próprias casas os pobres
que, por não terem onde, iam dormir nos cemitérios ou ruínas e outras
partes". E foi assim que o Pe. Miguel muito contribuiu para reforma dos
costumes no seu século e futuros.
ESCRITOR E MÍSTICO
Pe. Miguel provou quanto o Senhor é
suave e tudo o que realizou foi com a intenção de fazer com que todos também o experimentassem
e por estradas angustiosas e ásperas caminhassem até chegarem à união íntima
com Deus, se assim Ele fosse servido. Todos?! Eram todos, que ele desejava
conduzir, como vimos, desde as mulheres necessitadas de amor até as mais
ansiosas pelo Divino Amor.
Por isso falou e escreveu. Já foram
citados alguns escritos seus, mas o mais explícito se chama "Livro das
Três Vidas do Homem", "sobre o homem exterior ou corporal; sobre o
homem interior ou racional e sobre o homem íntimo ou espiritual". E confirmava:
"A intenção principalíssima de todo este livro é ensinar às almas de
oração o caminho verdadeiro do espírito puro e desnudo."
Procura
firmar-se nas experiências místicas e espirituais da sua própria vida e das
pessoas, que dirigia, porque estas experiências, além de se firmarem sobre a
inspiração de Deus, firmavam-se também nos ensinamentos dos místicos santos que
o precederam, de modo especial os carmelitas São João da Cruz e Santa Teresa;
para não errar e não cair no iluminismo.
Age como psicólogo, conhecedor dos
espíritos e usa de um estilo puro e ao mesmo tempo singelo, "claro, fácil
e fluente". As três vidas são aquelas mesmas três vias chamadas purgativa,
iluminativa e unitiva: dos principiantes, dos proficientes e dos perfeitos,
conforme prevaleça mais a força da graça, do espírito e do amor (unitiva) ou a
força da razão e capacidade discursiva (iluminativa) ou a força dos sentidos
(purgativa); a primeira deve prevalecer sobre a segunda e as duas sobre a
última e todas precisam de ser purificadas.
O "Livro", além da sua
introdução, é subdividido em três livros, de acordo com cada "vida",
que é - pois é do "Homem" que se trata - explicada antropologicamente
no que é, nos meios que exige e nos bons resultados, doces ou amargos, que irá
conseguindo até à união íntima, essencial, afetiva e amorosa com o próprio
Deus, mas só depois de ter mergulhado no conhecimento de Jesus Cristo, Jesus
Cristo Crucificado, e na união íntima de amor com Ele, "que me amou e se
entregou por mim" (Gl 2,20).
Sobre Miguel de la Fuente escritor,
nos diz Efrém de la Madre de Dios que ganhamos dele "uma jóia de
literatura" e sobre Miguel de la Fuente místico, Marcelino Menéndez y
Pelayo afirma: «Entre os filósofos do amor e da escola coloca-se a opinião intermédia,
ou melhor eclética, que com grande aparato de autoridades defende o iluminado e
extático varão, Frei Miguel de la Fuente carmelita, no seu Livro das três
vidas do homem: corporal, racional e espiritual, que é o melhor tratado de
"psicologia mística", que temos em castelhano, ao menos entre os que
eu conheço». E é este mesmo Menéndez y Pelayo quem coloca Frei Miguel entre os
maiores representantes da Escola Carmelita de Espiritualidade, ao lado de São
João da Cruz, Santa Teresa e Frei Jerônimo Graciano.
VIDA E MORTE DE FREI MIGUEL DE LA FUENTE
Graças a Deus já estamos na
pós-modernidade e ficamos alegres e satisfeitos por não ter de negar tudo, mas
reconhecer que também no século XVII um irmão nosso, carmelita, já exerceu a
pastoral rural, carcerária, dos pobres de rua, das prostitutas e com muito
sacrifício da sua própria pessoa, mas principalmente com muita ternura e muito
amor. É um exemplo! Diziam: "É um santo!"
As testemunhas do seu processo de
beatificação confirmam para nós hoje as suas virtudes de sempre. A Fé o conduzia às boas obras.
"Este servo de Deus foi homem de grande fé, que demonstrou com obras e
palavras quantas vezes se apresentaram as ocasiões".
Foi sempre animado pela Esperança, graças à qual empreendeu e
suportou coisas ardorosas: "andava sempre incitando a esta testemunha
assim como a outras pessoas a que amassem a Deus e pusessem a esperança em Sua
Majestade, desprezando o daqui de baixo em vista do celestial".
Tudo o que empreendeu foi por
instigação do Amor, da Caridade. Uma testemunha conservou
felizmente a sua "Profissão de Amor": "Eu, Frei Miguel de la
Fuente, desde hoje faço a minha profissão e prometo a Cristo Jesus e à sua Mãe
Santíssima amar a Deus e à Virgem Maria, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo; ocupar-me
todos os dias da minha vida em Deus e nos meus próximos e não deixar obra de
caridade, que sou capaz de realizar, sem realizá-la puramente por amor de
Deus". Conversava com Deus. No terceiro livro das "Três vidas do
Homem" deixa escapar este ato de amor: "Oh! Mestre Soberano, (...)
fala-me Tu ao meu coração mais intimamente, para que em paz, quietude e
silêncio Te ame sem cessar e sinta meu gozo junto de Ti". De Nossa Senhora
sempre fala com afeto filial e apresenta Maria como modelo e exemplo do
"homem racional", pois viveu intimamente os mistérios do seu
amantíssimo Filho e, depois da Ascensão do Senhor, gostava de visitar em
espirito ou mesmo corporalmente os lugares santificados pela presença de Jesus:
Belém, Egito, o deserto, o Sinai, Nazaré, o Jordão, Genesaré, Jerusalém,
Betânia etc. Maria seja também objeto da contemplação do "Homem/Mulher
racional" que terá com Ela filiais conversas cheias de carinho.
Garante-nos Maria Hernández que "foi ele das pessoas mais enamoradas da
Virgem".
As testemunhas confirmam a sua
fidelidade aos três votos de Castidade,
Pobreza, Obediência e nos asseguram que foi senhor da prudência, da fortaleza, da justiça e
da temperança, paciente, humilde, zeloso, mortificado. "Um
Santo!..." Era a voz do povo.
Agora podia morrer. Depois de três
meses de doença, assistido pelo sobrinho padre do mesmo nome, o Mestre Miguel
de la Fuente, o pobre Frei Miguel carmelita partiu para junto de Deus no dia 27
de novembro de 1625, dentro dos 53 anos de vida sobre a terra.
"Neste sentido (isto é, que é
pura ignorância todo altíssimo conhecimento que possamos ter de Deus aqui na
terra) explicou S.Gregório aquela maravilhosa visão do nosso grande Pai, o
Profeta Elias, quando em oração na sua cova no Monte Horeb viu Deus passar e
cobriu o rosto com a capa, como dando a entender, diz S.Gregório, que todo
conhecimento humano (...) não tem proporção nenhuma com quem é Deus e quem
quiser conhecê-lo há de ser trancando os olhos como fez o nosso Pai Elias e
confessando a própria ignorância". (Cfr. "As Três Vidas",
L.III 5,4)