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quinta-feira, 10 de março de 2016

Petrópolis perde um ícone da Igreja Católica

A morte trágica do Frei Antônio Moser gerou muitas reações de solidariedade em Petrópolis e pelo Brasil entre entidades religiosas e políticos. O religioso era conhecido mundialmente e, em outubro do ano passado, ele foi o único teólogo brasileiro nomeado pelo Papa Francisco para o Sínodo da Família, no Vaticano. Oficialmente, frei Moser completou 50 anos de vida sacerdotal no dia 15 de dezembro. Também houve manifestações de indignação com a falta de segurança da BR-040. Apesar da família extensa, apenas uma irmã de Frei Antônio Moser ainda é viva, Maria Moser, hoje com 82 anos, que reside no município de Itajaí (SC). No entanto, Frei Moser mantinha relação próxima com primos, sobrinhos e amigos que residem no município.
– Ele me ligava duas, três vezes por semana para saber se estava tudo bem, como estava a cidade. Era uma pessoa muito boa, de um coração enorme, uma grande perda, é até difícil falar neste momento – conta o sobrinho Mário Moser.

Dom Gregório Paixão
– É um sentimento de profundo vazio. Ele era uma pessoa que estava profundamente presente na nossa vida. Um irmão sábio, mais velho, que labutava na área da educação e que estava presente nos mais diversos setores da nossa diocese. Então, para nós, é realmente uma perda irreparável. Estamos muito unidos à comunidade franciscana. O sentimento é de arrancar uma parte nossa, que fazia parte do viver da nossa comunidade, que estava sempre ao nosso lado e batalhando pela paz e pelo bem. Às vezes, aqueles que lutam muito pela paz e pelo bem têm mortes trágicas. O exemplo mais claro disso é Jesus Cristo, os mártires da igreja e muitas outras pessoas ligadas à igreja ou não, como Martin Luther King e Gandhi, que lutaram pela paz e acabaram morrendo violentamente por um ato impensado de pessoas que, infelizmente, não estavam com Deus naquele instante – afirmou o bispo.
Conferência Nacional dos Bispos (CNBB)

O secretário geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Leonardo Steiner, destacou a atuação do religioso junto à entidade.
– A vida de Frei Antônio Moser foi rica e fecunda. Assessorou a Conferência na elaboração de textos e na reflexão teológica, especialmente, na teologia moral. A CNBB é grata pela ajuda recebida e pede ao Pai misericordioso que acolha o frade menor no Reino definitivo. Brilhe para ele a luz da eternidade – acrescentou.

O arcebispo do Rio, Dom Orani Tempesta, também divulgou nota de pesar.
“Surpreendidos com a notícia, me uno em oração pela sua alma e estendo meu abraço a seus familiares, à toda comunidade e ao bispo da diocese de Petrópolis, dom Gregório Paixão, e aos membros superiores da Ordem dos Frades Menores (OFM), na qual ele fazia parte. Apesar da dor, em nome da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, rogo a Deus que o perdoe de suas faltas e o receba em sua infinita misericórdia”.

Canção Nova
O religioso estava indo para São Paulo, onde participaria do programa “Em Pauta”, da TV Canção Nova, como fazia toda quarta-feira. O Fundador da Comunidade Canção Nova, Monsenhor Jonas Abib, afirmou que recebeu com tristeza a informação da morte de Antônio Moser.
– Homem de Deus, de imensa sabedoria, foi um dos 11 brasileiros convidados pelo Papa Francisco no Sínodo das Famílias do ano passado. Sua defesa apaixonada pela dignidade da vida, do ser humano, nos iluminou e não será apagada por este ato de violência – afirmou Abib.

O ministro provincial da comunidade franciscana, Frei Fidêncio Vanboemmel, lamentou a morte trágica.
– Frei Antônio Moser sempre teve como marcas o entusiasmo e a determinação. Atuou em muitas frentes simultaneamente, desde o estudo e a pesquisa, o trabalho pastoral, as aulas, conferências, o trabalho na comunicação, a dedicação a obras sociais. Especialmente nas décadas de 1970 e 1980, dedicou-se de corpo e alma ao pastoreio de comunidades da Baixada Fluminense, atuando na formação do povo e na construção de igrejas. Hoje, infelizmente, devolvemos a Deus a vida deste irmão, vítima de assassinato na mesma Baixada que tanto amou. Que sua partida leve toda a sociedade a buscar caminhos alternativos, que vençam a violência e a dor, que suplantem a injustiça e a morte, que abram para o mundo um horizonte de esperança. Para nossa Província fica um vazio e aumenta nossa responsabilidade em levar adiante o legado por ele deixado – comentou Vanboemmel.
O vigário provincial, Frei Evaristo Spengler, lamentou muito a morte dele, com quem esteve um dia antes. Para ele, Frei Moser estava no auge de sua vida religiosa e de seu trabalho de evangelização.
– Além de ser meu confrade, meu professor de Teologia, ele é primo de minha mãe. É uma perda muito grande para a Província e para a Igreja. Ele foi uma referência na Teologia Moral do Brasil. Prova disso foi a sua nomeação para o Sínodo da Família – lembrou o Vigário Provincial.

Políticos cobram mais segurança na BR-040
Na cidade, a prefeitura e a Câmara decretaram luto oficial por três dias. O franciscano receberia Medalha Koeler Cruz de Mérito na próxima semana, a maior honraria concedida pelo Legislativo do município.
O prefeito Rubens Bomtempo disse que espera que a vida de Moser sirva de exemplo.
– Deixa como legado um importante trabalho em defesa da paz e em prol da educação, evidenciado especialmente no Centro Educacional Terra Santa. A morte de Frei Moser é uma perda irreparável para Petrópolis, mas também para o Brasil e para o mundo. Que suas lutas nos sirvam de exemplo, para que possamos garantir cada vez mais oportunidades aos mais pobres e continuar construindo um mundo melhor para todos – declarou.

O presidente da Câmara de Vereadores, Paulo Igor (PMDB), anunciou que o Legislativo vai cobrar mais policiamento e segurança na BR-040.
– A morte de frei Antônio Moser, de forma tão violenta, nos choca a todos. Decretamos luto oficial por três dias na Câmara de Vereadores e estamos estudando medidas a serem adotadas pela Casa para reivindicar mais segurança para usuários da BR-040, uma vez que desde o ano passado já havíamos solicitado diretamente à Polícia Rodoviária Federal e à Polícia Militar reforço no policiamento, bem como à Concer ações para melhorar as condições de segurança na rodovia, em todo o trecho usado diariamente por milhares de petropolitanos – falou.

O secretário de Habitação e deputado estadual licenciado, Bernardo Rossi (PMDB), também afirmou que tomará providencias nesse sentido.
– Estou oficiando as esferas de segurança, a empresa e a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) mesmo sendo deputado licenciado, para que essa medida seja discutida e colocada em prática com a sociedade. Hoje (ontem), na Alerj, estive com o deputado Luiz Paulo Correa da Rocha e pedi também sua participação para que sejam tomadas medidas urgentes – disse.

O deputado federal Hugo Leal afirmou que recebeu com grande pesara notícia da morte do frei Antônio Moser, com quem mantinha laços de amizade.
– Lamento imensamente o fato da vida de Moser ter sido tirada de forma tão brutal, resultado da livre ação criminosa que, com grande frequência, faz vítimas na Rodovia Washington Luiz. É inadmissível que vidas continuem sendo ceifadas devido à falta de investimentos do Estado e a ineficiência da Concer, que cobra tarifas altas de pedágio, em promover a segurança dos usuários da rodovia – colocou Leal.

A deputada federal Cristiane Brasil (PTB) também cobrou a punição dos responsáveis por essa “barbárie”.
– Esperamos que a polícia apure e que se punam com rigor os responsáveis por mais essa barbárie. A violência que a todos ameaça no país fez mais uma vítima e isso não pode ser visto com naturalidade. Como petropolitana, me solidarizo com a cidade pela perda do frei Antônio Moser, religioso importante não só para nossa comunidade, mas também nome reconhecido no Vaticano e nos círculos mais elevados da Igreja Católica. Consternada, deixo meus sentimentos em especial para aqueles que desfrutaram do convívio desse homem especial, seja como teólogo, seja como professor ou quaisquer das muitas atividades que frei Antônio desempenhou em Petrópolis – colocou a deputada.

Outra figura petebista, o deputado estadual Marcus Vinícius Neskau também comentou sobre a morte de Antônio Moser.
– Foi com profundo pesar que recebi a triste notícia do crime que retirou a vida do Frei Moser, figura tão querida e importante não só para a igreja, a cultura e a cidade de Petrópolis como para o País. Não há palavras para expressar o sentimento de todos nós sobre essa perda inesperada. Solidarizo-me com a família do Frei, a igreja e todos os petropolitanos que, assim como eu, dispensavam por ele grande carinho e admiração – falou.

Firjan e CBL
A Firjan lamentou a morte do diretor-presidente da Editora Vozes, que é integrante do Sindicato das Indústrias Gráficas de Petrópolis e uma das mais simbólicas indústrias do município e do Estado do Rio de Janeiro, segundo a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro. Em nota, enviou votos de solidariedade com os familiares e amigos de Frei Moser, “uma pessoa excepcional e que levou a palavra de Deus e os valores cristãos de amor ao próximo aos mais carentes”, e lembrou que ele foi membro do Conselho de Empresários da FIRJAN na Região Serrana por sete anos.

A Câmara Brasileira do Livro (CBL) também manifesta “seu mais profundo pesar” e afirmou que “a indústria editorial de nosso país está em luto pela grande perda”. “A CBL repudia esse crime brutal, que atinge todo o setor livreiro, esperando que seja elucidado e que os responsáveis recebam a sanção legal cabível”, encerrou a nota. Fonte: http://diariodepetropolis.com.br

FREI ANTÔNIO MOSER: Homenagem do Olhar- 02.

FREI ANTÔNIO MOSER: Homenagem do Olhar- 01.

domingo, 6 de março de 2016

Populismo x elitismo na Igreja.



Dividido ideológica, sociológica e etnicamente, o catolicismo precisa redefinir-se, defende Massimo Faggioli, teólogo italiano, professor na University of St. Thomas (EUA) e na Villanova University (EUA), em artigo publicado por Global Pulse, 29-02-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Segundo ele, é “um paradoxo que a Igreja Católica, que teme introduzir métodos democráticos em sua própria estrutura de governo, seja uma das defensoras mais convictas da democracia que não seja procedimental, mas de natureza social; isto é, uma democracia que esteja a serviço do todas as pessoas”.

Eis o artigo.
Sem dúvida, o Papa Francisco é antielitista. A sua biografia, sua linguagem e sua mensagem estão firmemente enraizadas na “Teologia do Povo”. Mas isso é o suficiente para rotulá-lo de populista?
Essa indagação é importante por dois motivos: primeiro, para compreender Francisco e a oposição a ele; e, segundo, para compreender o quanto a Igreja Católica faz parte da “era do populismo” em que estamos vivendo.
Populismo e reações negativas ao estilo de catolicismo de Francisco
Um dos modos típicos em que se pode descartar o convite do papa latino-americano a um sistema social e econômico mais justo é rotulando-o de populista
Como prova, os opositores apontam para os seus comentários históricos a respeito do candidato populista à presidência dos EUA, Donald Trump.
“Uma pessoa que pensa apenas em construir muros, onde quer que seja, e não em construir pontes, não é um cristão. Isso não está no Evangelho”, contou aos repórteres o papa de 79 anos no final de sua recente viagem ao México.
“Quanto ao que você dizia sobre se eu aconselharia a votar ou não: não vou me envolver nisso. Digo apenas que esse homem não é cristão se ele disse coisas como essas. Devemos ver se ele disse as coisas dessa maneira e nisso dou o benefício da dúvida”, acrescentou.
Os mais famosos dos especialistas católicos contrários a Francisco ponderaram sobre essas afirmações e concluíram, como um deles o fez em artigo no New York Times, que Trump e o papa eram, os dois, populistas.
No entanto, existem muito mais diferenças do que semelhanças entre este papa jesuíta argentino e o bilionário candidato à presidência dos Estados Unidos da América.
Acusar Francisco de ser populista diz, na verdade, mais sobre o horizonte moral e intelectual do mundo ocidental em que a Igreja atualmente vive. Antes de tudo, tem a questão de quem se põe a acusar o papa de populismo. É interessante ver que aqueles católicos que formam o seu polo oposto em termos ideológicos são a expressão dopopulismo católico típico das elites.
O colunista acima mencionado do New York TimesRoss Douthat (ex-aluno de Harvard, um dos símbolos do elitismo americano), jogou, poucos meses atrás, com a ideia populista de que os teólogos profissionais não têm uma voz que precisa ser respeitada (pelo menos) no cenário público, onde “uma guerra civil na Igreja” está em jogo.
​O falecido juiz da Suprema Corte americana Antonin Scalia (outro ex-aluno de Harvard) encarnava um catolicismo que revelava com desprezo os assim-chamados "sofisticados" formados pela elite acadêmica secular e informados pela imprensa convencional.

A Igreja na era atual do populismo
populismo é muito complexo na Igreja e está ligado à nostalgia por uma época em que estava claro quem se encontrava no comando e quem estava ausente. Um exemplo é a natureza elitista da acusação de populismo contra a reforma litúrgica e a virada às línguas vernáculas.
Agatha ChristieCristina Campo e, mais recentemente, o autor alemão Martin Mosebach não estão exatamente argumentando pela volta da missa em latim. Todavia, defendem a recuperação de algo que foi popular no sentido de que as pessoas praticavam-no, mesmo que não o entendessem. Afirmam defender um catolicismo supostamente popular, pré-Vaticano II. Mas este é inerentemente elitista.
Todo discurso sobre o populismo teológico precisa se relacionar com a ideia de “povo”. O fato é que se tornou difícil identificar “o povo” na Igreja bem como em nosso discurso político.
O século XX foi a era da mobilização das massas no Estado-nação, assim como na Igreja. Essa era foi substituída por um órgão social e eclesial mais fragmentado.
Costumava ser fácil identificar a elite católica com o clero, com intelectuais católicos e com líderes políticos católicos. Hoje, o papel de liderança do clero está em apuros, e existem líderes leigos católicos cuja voz importam mais do que a de muitos bispos e cardeais.
Por outro lado, “o povo” ainda é uma categoria importante para a Igreja, mas muito mais como uma ideia teológica (o Povo de Deus) do que como uma realidade homogênea, socialmente tangível.
Dividido ideológica, sociológica e etnicamente, o catolicismo globalizado precisa redefinir quem é o seu povo. Aqueles que acusam Francisco de populismo usam um entendimento puramente político de populismo. Muito distantes das preocupações deles estão implicações teológicas do que significa “povo” para a Igreja.
Mas o populismo é, mesmo, um problema na Igreja Católica atualmente? 
Sim, mas isso nada tem a ver com analogias superficiais entre o Papa Francisco e Donald Trump.
Uma das consequências inesperadas do Concílio Vaticano II foi o início de uma mudança profunda das elites no catolicismo contemporâneo. Compreender isso é uma tarefa enorme que corre por debaixo da superfície do atual pontificado. O papa está bem ciente da transformação nas elites que aconteceram nos últimos 50 anos mais ou menos.
Basta olhar para como ele se dirige a dois atores-chave no cenário onde a batalha pela liderança católica ocorre: osbispos e os novos movimentos eclesiais. Por exemplo, ele se dirige aos bispos de um modo que revela a sua opinião sobre as deficiências da eclesiologia “episcopaliana” do Vaticano II.
Mas Francisco não está apenas falando aos bispos sobre as ilusões dos seus eternos líderes. Em seus discursos e diálogos com os movimentos católicos (Comunhão e Libertação, Caminho Neocatecumenal, etc.), o papa sempre salienta que a Igreja não necessita de elites que estejam isoladas do resto da comunidade eclesial.
Mas será que isso significa que ele é um líder populista?
Sim, mas somente se a perspectiva de quem vê estiver baseada em considerações políticas, como acontece de ser o caso para a maioria das oposições do papa.
Acusar Francisco de abraçar o populismo evita, por completo, o fato de que, como líder de uma “Igreja como Povo de Deus”, ele é constitucionalmente um populista. Também revela que, para os comentadores mais políticos e religiosos atuantes na imprensa convencional de hoje, o espectro das culturas políticas aceitáveis é o espaço estreito entre otradicionalismo e o conservadorismo na direita e, na esquerda, os moderados e reformistas.
Na nossa era, o radicalismo se tornou a heresia ulterior, tanto na Igreja Católica quanto no mundo dominado pelo paradigma tecnocrata. O convite à justiça social e econômica é facilmente reduzido ao populismo (o que, para uns, é uma variação do comunismo) em um mundo onde a política está em retirada, o autoritarismo está em ascensão e a Igreja é uma das últimas instituições globais com a coragem, com a gravitas e com os recursos de falar a verdade ao poder instituído.
Nessa situação, constitui um paradoxo que a Igreja Católica, que teme introduzir métodos democráticos em sua própria estrutura de governo, seja uma das defensoras mais convictas da democracia que não seja procedimental, mas de natureza social; isto é, uma democracia que esteja a serviço do todas as pessoas.

E isso é exatamente aquilo que os que acusam Francisco de estar sendo populista não gostam nesse papa. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br