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sexta-feira, 25 de setembro de 2015

TRÍDUO A SANTA TERESA DE LISIEUX: 3º Dia.


* Dom Frei Vital Wilderink, O Carm, In Memoriam.

Terceiro dia. Tema: O amor de Deus e do próximo

Acolhida
1. Criar um bom ambiente, dando as boas-vindas e colocando as pessoas à vontade.
2. Canto inicial. Sugestão: “Toda a Bíblia é comunicação”. Durante o canto são introduzidas a Bíblia e, em seguida, uma imagem de Santa Teresinha, e colocadas sobre uma mesinha no meio de grupo.
3. O presidente ou coordenador da celebração apresenta brevemente o assunto que vai ser refletido, meditado e rezado neste terceiro dia da novena.
4. Os participantes invocam a luz do Espírito Santo.

O caminho do amor
            Não há dúvida: o amor é a experiência mais universal, mais alta, doce e difícil do ser humano. Ela se reveste de diversos aspectos e dimensões,  de degraus e etapas, de diversas motivações e expressões. Mesmo inconsciente no início, é uma energia primordial que procura alcançar seu objetivo que é de ser aceito como bebê, criança, adolescente, jovem, adulto. É como um anseio do próprio desenvolvimento, sempre acompanhado de um apetite de prazer. Primeiro no plano biológico e psíquico, depois, com o nascer da consciência e do conhecimento, no nível  do afeto da alegria de ser aceito, respeitado e querido como gente. A busca da realização humana em todos seus aspectos sempre está ligada ao respeito da dignidade da pessoa. Do contrário, haverá uma quebra, uma ferida, uma diminuição da responsabilidade mútua que é inerente ao amor. Querer-se bem, querer o bem do outro é uma caminhada difícil que exige uma transformação do nosso eu para abrir o espaço para o amado. A experiência nos ensina que esse mesmo eu é frequentemente da sua própria prisão a vigia mais eficiente.
.           Do momento em que o ser humano faz sua entrada na terra, já no seio materno, manifesta-se nele uma energia primordial que o impulsiona para seu desenvolvimento. É uma força orgânica, biológica e psíquica que, como princípio de prazer, vai em busca de uma afirmação. Mas no ser humano não existe apenas um anseio pelo prazer. Esta aspiração se entrelaça com outro desejo forte: que me aceitem como gente. Querer ser aceito e respeitado é a primeira expressão da dignidade humana.  É toda uma trajetória, que se estende, de modo diferenciado, ao longo  dos anos da vida. e que vai configurando a relação existencial do ser humano  com o ambiente e seu próprio estado vital. Tudo isto ressoa, de maneira dificilmente discernível, na sua consciência e vai plasmando a afetividade do sujeito. O afetivo está presente em todos os setores e dimensões da vida de uma pessoa. No seu caminho de amadurecimento cabe-lhe não só interpretar os seus afetos, mas também tomar uma atitude diante delas.
            Algumas reminiscências que Teresinha guardou da sua infância esclarecem, de modo mais concreto, como isto se deu na vida dela. Ela tinha quatro anos e oito quando sua mãe morreu de câncer. Entre a mãe e a filha existia uma relação afetiva muito forte. Apenas podemos conjeturar o quanto a falta da afeição materna prejudicou a criança na sua evolução psicológica.  Teresinha tornou-se retraída, com uma sensibilidade à flor da pele. A nova e confortável residência em Lisieux para onde a família se mudou, era o ninho que lhe dava ainda certa segurança. O que faz uma criança nestas condições? Chora para atrair a atenção. Mesmo com seus 12 a 13 anos de idade, Teresinha não consegue vencer a sua sensibilidade infantil. “Era realmente insuportável” como comentará mais tarde. Mesmo o horizonte religioso, àquela altura já presente na sua consciência, não conseguia curá-la de sua hipersensibilidade. Às vezes procurava cumprir certas tarefas domésticas às escondidas, “unicamente por amor de Deus”. Mas quando os familiares  não manifestavam nenhum agradecimento ou elogio, as lágrimas da Teresinha já começavam a rolar.
            Mas na Festa do Natal de 1886, acontece o que Teresinha chamará de “a graça de sua conversão completa”. A família voltava da Missa do Galo. Chegando em casa, as crianças corriam para a lareira para pegar seus sapatos cheios de  presentes natalinos. O costume continuava mas só para  Teresinha, que uma semana depois faria quatorze anos! O pai, cansado com a Missa da meia noite, se irritou quando viu os sapatos  da sua filha caçula na lareira. Ainda fora da sala, Teresinha escutou o comentário mal humorado de seu querido pai: “Felizmente que esta vai ser a última vez!” As lagrimas já começaram a brilhar nos olhos da Teresa. Ela subiu a escada para tirar o chapéu. Deixemos que ela mesma conte: “Celina também estava bem a ponto de chorar, pois me queria muito bem e compreendia minha mágoa: “Ó Teresa, disse-me ela, não desça. Seria muito penoso ir neste momento ver o que há nos teus sapatos”. Teresa, porém, já não era a mesma. Jesus tinha transformado o seu coração. Depois de sufocar minhas lágrimas, desci lépida a escadaria. A comprimir as batidas do coração, peguei meus sapatos, coloquei-os diante do papai, e fui tirando alegre todos os objetos, com ar feliz, como o de uma rainha. Papai ria-se, tinha também recuperado a alegria, e Celina estava sob a impressão de um sonho!”.
            Constata-se que, quando o sujeito se vê forçado a reprimir uma tendência, esta é estimulada não somente pela presença de seu objeto conatural, mas também por efeito de um estímulo que encaminha para o objeto por uma associação às vezes casual. Desta maneira aparecem reações agressivas ou alterações nervosas no comportamento. De outro lado, o ser humano é capaz de interromper, por um ato de vontade, a sequência entre uma necessidade sentida e a sua satisfação. Por esta capacidade, exercitada ou não, o ser humano pode subtrair-se na sua conduta à direção do prazer e da dor. Aqui a razão entra no campo afetivo como outro princípio de ação e faz tomar distância do próprio ambiente de vida conseguindo assim impor o seu domínio.  Apresenta-se neste caso algo que possui um alcance maior que a simples necessidade: é o desejo. Os limites do desejo humano não se definem. Cada desejo aponta para um além. Se não fosse assim não haveria renovação do nosso ritmo vital. A nossa vida ficaria presa ao instante das necessidade percebida. Seria o tédio. ”O vento sopra para o sul, depois gira para o norte e, girando e girando, vai dando as suas voltas. Todos os rios correm para o mar, e o mar nunca transborda; embora cheguem Ao fim do seu percurso, os rios sempre continuam a correr”(Ecl 1, 6-7). Como ser pensante abre um parêntese, intercala um espaço não previsto, entre a sucessão das necessidades e suas satisfações. É um “silêncio” certamente não de agrado à sociedade de consumo e à lógica da eficiência do mercado.
            A afetividade humana tem na condição biológica o seu ponto de partida, seu primeiro suporte. Mas não se reduz a estímulos instintivos. Os sentimentos e emoções humanas superam a mera reação biológica. A afetividade humana, com suas duas vertentes, animal e racional, é fundada na unidade da consciência. O que implica na necessidade de uma disciplina pessoal e de uma opção que supõe uma visão do sentido da vida. Na visão da fé cristã, o homem não é uma “paixão inútil”. Reconhece, sim, que a sua existência tem um caráter dramático devido a uma deviação originária.
            No ser humana a afetividade se fundamenta tanto sobre a corporeidade como sobre a racionalidade. O que implica nele uma passividade em relação às suas necessidades e aspirações. Isto não só no âmbito biológico, mas também no nível do seu intelecto uma vez que a vida racional se abre para um horizonte de certo modo infinito. Se o ser humano, a partir dessas suas características fundamentais, não fosse “alvo”, não haveria ressonância de nada na sua consciência, ressonância que precisamente constitui a instância afetiva. Nem haveria, por conseguinte, um estímulo para o agir humano, que pressupõe, por sua vez, uma capacidade de discernir. A questão do discernimento será sempre complexa por causa da junção paradoxal da receptividade passiva e da atividade desbravadora. A repercussão afetiva de uma situação corresponde a condições objetivas ou é efeito de uma emotividade subjetiva?  É provável que haja sempre uma combinação dos dois fatores com um leque muito variável de proporções.
            Considerando a abertura universal da nossa inteligência, não se pode excluir da afetividade do ser humano em relação a Deus. Os escritos da tradição da fé judaico-cristã possuem uma linguagem claramente afetiva. Não aparece neles um Deus descoberto por filósofos a partir das aspirações transcendentes, mas de um Deus que Ele mesmo toma a iniciativa de ir ao encontro do homem. É o Deus que se revela, que estabelece uma aliança com o homem: é um Deus de amor.
            Apela-se à razão para negar objetividade a essa visão. Em defesa de uma explicação geral e objetiva do real, elaboram-se teorias com pretensões de filosofias universais, que tornam desnecessário qualquer outro nível de pensamento. São teorias que, excluindo a metafísica, explicam cientificamente a origem do real, até chegar a um ponto que lhes é cientificamente inatingível. Ponto onde adivinham uma necessidade, um acaso, enfim algo sem razão. Colocando o irracional como fundamento, fazem desabar sua própria construção racional, uma vez reduzem a própria razão a um produto casual do irracional. A fé cristã não interrompe a linha do racional pois coloca no princípio o Verbo, a força criadora da razão no princípio de todas as coisas.  Não se vê como declarar irracional o terreno em que os argumentos científicos e o próprio pensamento filosófico não conseguem penetrar. A fé cristã dá a esse terreno o nome de mistério, não porque deixa de optar pela primado do racional sobre o irracional, mas porque para ela a razão verdadeira é o amor e o amor é a razão verdadeira. Amor e razão coincidem. Há algo de irracional em negar que na sua unidade eles são as o verdadeiro fundamento e objetivo do todo o real. 
            Para a fé cristã Deus é um Deus que se revela ao homem entrando na sua história.  Revelação que atinge no mistério da Encarnação seu ponto mais alto. Deus assume em Cristo um coração humano. As manifestações afetivas do Coração de Cristo são sentimentos divinos: sua bondade, sua misericórdia, mas também seu medo e sua angústia. Santa Teresinha escreve: “Como é linda a nossa religião, em vez de restringir os corações (como imagina o mundo), eleva-os e torna-os capazes de amar, de amar com amor quase infinito”.   De fato, a revelação de Deus visa uma participação à sua vida divina. Assim afirma a segunda carta de Pedro: “O seu divino poder nos presenteou com tudo o que contribui para a vida e para a piedade, mediante o conhecimento daquele que nos chamou por sua glória e poder. Por sua glória e poder, ele nos presenteou com os bens prometidos, os maiores e mais valiosos, a fim de que vós vos tornásseis participantes da na-tureza divina, fugindo da corrupção que a concupiscência espalha no mundo”(2 Pd 1,3-4).  Santa Teresinha pedirá na sua oblação ao amor misericordioso de Deus que ele deixe transbordar em sua alma as ondas de infinita ternura que estão encerradas nele.  As expressões utilizadas por Teresa já manifestam a sua reação afetiva à iniciativa do amor misericordioso de Deus.
            Teresa se deixa monopolizar por esse amor infinito de Deus que nela se reveste de uma forte acentuação cristológica.  Trata-se de um conhecimento experiencial que a faz falar e agir. É neste olhar amoroso fixado em Jesus que se encontra o segredo do seu ardor missionário, do seu desejo de fazer com que Deus seja amado. Não é um sonho infrutífero. Ela encontrou nisto a sua missão na Igreja. Missão que ela traduz concretamente no dia-a-dia de seus relacionamentos humanos no espaço restrito do Carmelo de Lisieux. Em virtude desse dinamismo do amor, desencadeado pela iniciativa de Deus, Teresa se vê realizando todas as missões particulares que para ela são suscitadas pela mesma iniciativa divina. Mas ela descobre que a impossibilidade de ampliar o alcance de espaço e do tempo, não restringe a universalidade  da sua vocação que se deixa absorver pelo amor de Deus. Em agosto de 1897, diante de uma imagem de Joana d’Arc na prisão, ela afirmará: “Os santos encorajam também a mim, na minha prisão. Eles me dizem: ‘Enquanto estiveres acorrentada, não poderá cumprir tua missão; mais tarde, porém, após a tua morte, será a hora de teus trabalhos e conquistas’”.
            A pertença a Cristo conferida no batismo produz uma conformação real, uma relação de filho de Deus, condição que não pode deixar de ressoar na consciência traduzindo-se afetivamente. Assumir esta filiação significa tomar consciência da necessidade de uma entrega à vontade do Pai que “sabe que precisais de tudo isso”(Mt 6, 32). À medida que esse espírito filial crescer e se fortalecer, a apreensão diante do juízo, sempre presente no horizonte da consciência pecadora, vai se dissolvendo diante da confiança: “No amor não há temor. Ao contrário, o perfeito amor lança fora o temor, pois o temor implica castigo, e aquele que teme não chegou à perfeição do amor” 1Jo 4, 18).
            O evangelho de Jesus Cristo é uma revelação do amor, Amor que é o próprio Deus. Por isto, “quem permanece no amor, permanece em Deus e Deus permanece nele” ( 1Jo 4,16). A caridade como amor teologal, nos faz amar. Retifica, confirma, universaliza e diviniza a nossa capacidade de amar. O nosso próximo não nos oferece simplesmente uma ocasião para amar a Deus. Ele é amado, estimado e querido em si mesmo, enquanto participa do amor que vem de Deus. A caridade descobre essa amabilidade que o próximo tem em si, leva a ver o próximo em Deus, na inefável condescendência do Amor divino.
  
O amor na Bíblia
Introdução à leitura do texto bíblico.
A caridade como plenitude do amor unifica a pessoa por dentro. Por isto só uma pessoa que ama é capaz de sair de si mesmo, sem alarido, como canta São João da Cruz:
Em uma noite escura, às escuras, segura, com ânsias, em amores inflamada, pela secreta escada disfarçada, ó ditosa ventura!          ó ditosa ventura! Saí sem ser notada,            em trevas e em celada, ‘stando já minha casa sossegada,            ‘stando já minha casa sossegada.
Ao sair, não tem a impressão de ter deixado algo para trás pela simples razão de “a amada no Amado (estar) transformada” sem impressão de ter deixado um bem para trás pela simples razão de “a amada no Amado (estar) transformada”, como canta São João da Cruz. É uma sedução que paradoxalmente intensifica a liberdade, a espontaneidade e a responsabilidade daquele que ama. É vocação de todos nós caminhar para esta perfeição do amor.

Perguntas para a reflexão:
•Cada um comenta um pouco o diálogo entre Jesus e o jovem rico.
•Em que sentido o convite de Jesus ao jovem pode e deve ser aplicado a nós?

 Teresa, Doutora do Amor.
            Em 1998 Teresa de Lisieux foi proclamada Doutora da Igreja pelo Papa João Paulo II. Já no pontificado de Pio XI que a canonizou em 1925, houve tentativas de conceder a Santa Teresinha o título de Doutora da Igreja. Malgrado sua profunda devoção à nova Santa que ele chamava de  “Estrela do meu Pontificado”, Pio XI não atendeu a essa expectativa. O motivo? Porque se tratava de uma mulher. Mais tarde, duas outras santas mulheres receberam o título: Santa Teresa de Ávila e Santa Catarina de Sena. Hoje existe um movimento para que uma terceira carmelita, Edith Stein, seja proclamada doutora da Igreja. A condição feminina parece hoje um elemento até favorável para mostrar que a Igreja não é machista.
            Doutor da Igreja é um título oficialmente dado pelo Magistério da Igreja a certos escritores notáveis, tanto pela santidade de vida quanto pela importância e ortodoxia de sua doutrina. Sem dúvida, houve outros que ao longo dos séculos seguiram o pequeno caminho, como a Virgem Maria, mas devemos reconhecer que foi Santa Teresinha que lhe deu um brilho e uma influência universal. Pode-se perguntar o que existe de próprio na doutrina teresiana. Vários aspectos poderiam ser apontados, mas o centro é, sem dúvida, o amor. Amor, palavra muitas vezes banalizada. Teresa lhe devolve a sua seriedade ao fazer dele a sua própria vocação. Ela tornou-se Doutora do Amor.
A caridade deu- me a chave de minha vocação. Compreendi que, se a Igreja tinha corpo, composto de vários membros, não lhe faltava o mais necessário, o mais nobre de todos. Compreendi que a Igreja tinha coração, e que o coração era ardente de amor. Compreendi que só o amor fazia os membros da Igreja atuarem, e que se o amor se extinguisse, os apóstolos já não anunciariam o Evangelho e os mártires se recusariam a derramar  seu sangue. Compreendi que o amor abrange todas as vocações, alcançando todos os tempos e todos os lugares. Numa palavra é terno. Então no transporte de minha delirante alegria, pus-me a exclamar: Ó Jesus, meu amor, minha vocação, encontrei-a afinal: MINHA VOCAÇÃO É O AMOR.
            Amor será também a última palavra que ela pronuncia na sua agonia: “Oh! eu o amo!... Meu Deus... eu vos amo!...”.   Desde cedo, antes de entrar na sua adolescência, Teresa “sentia o desejo de amar só a Deus, de não encontrar alegria senão nele”.   Já no fim da vida, o mesmo desejo, amadurecido e purificado pelo sofrimento: “Vós o sabeis, ó meu Deus, nunca desejei outra coisa senão amar-vos, não cobiço outra glória. Vosso amor sempre me preveniu desde a infância, comigo cresceu, e agora se tornou um abismo, cuja profundeza não sei calcular. Amor atrai amor. Por isso, meu Jesus, o meu se atira em vossa direção, querendo atestar o abismo que o empuxa, mas infelizmente não representaria sequer uma gota de orvalho, diluída no oceano! Para vos amar como vós me amais, ser-me-ia necessário lançar mão de vosso próprio amor”. 
            Poderíamos perguntar se Teresa em todas essas declarações de amor, não manifesta uma ilusão de estar abrigada numa torre de marfim, fechada no seu eu que ela projeta num amor de Deus. Não faz lembrar Teresinha menina, que em passeio vespertino, segurando a mão de seu pai pedia-lhe que a guiasse?  “Então, não querendo ver nada desta terra mesquinha, sem olhar onde punha os pés, erguia a cabecinha bem alto para o ar, e não me cansava de contemplar o azul do céu estrelado!”   A autenticidade do nosso amor a Deus não se manifesta na qualidade do nosso amor aos outros nas realidades concretas onde se desenvolve a nossa existência? Certo, Teresa nunca deixou de sonhar com o dia em que estaria reunida com toda a sua família no Céu. Saudades sublimadas do tempo de sua infância?  É descobrindo o amor de Deus que Teresa faz o caminho de volta, da fugacidade do tempo e de todas as coisas para a preciosidade do momento presente: “Que me importa, Senhor, se no futuro há sombra? Rezar pelo amanhã? Minha alma não consente! Guarda meu coração puro! Cobre-me com tua sombra. Agora, no presente!”  Se penso no amanhã, temo ser inconstante, vejo nascer em meu coração a tristeza e o enfado. Eu quero, Deus meu, o sofrimento, a prova torturante agora, no presente!”
Teresa saiu do seu eu com seus inúmeros desejos de tira-gosto. O que sobrou foi o desejo do desejo de amar a Deus.  Suas três irmãs de sangue, carmelitas no mesmo mosteiro, se reuniam junto à cama da caçula da família. Escutemos o diálogo: “O que você quer que digamos hoje?... A melhor coisa seria não dizer absolutamente nada, porque, para dizer a verdade, não há nada para dizer. Tudo já foi dito, não é? Teresa fez um lindo sinalzinho com a cabeça: Foi!... Sofro somente um instante. Nós nos desanimamos e desesperamos apenas por pensarmos no passado e no futuro”.   Quem tem consciência de morar no amor de Deus, tem outra maneira de relacionar-se com o tempo. Não faz as coisas para poder fazer outras. Ele é o que faz.  
            A confiança e o abandono nas mãos de Deus e o sentir-se amada por Ele é em Teresa a fonte do amor aos outros. Deus é a única opção de Teresa. Mas o amor entre os dois não é um diálogo fechado. O mundo está presente nele. É um diálogo no tempo e na história que encontra a sua fonte no mistério da Encarnação, e, de modo denso, no mistério da Paixão de Cristo. “Como a torrente, lançando-se com ímpeto no oceano, arrasta após si tudo quanto encontra de passagem, assim também, ó meu Jesus, a alma que imerge no ilimitado oceano de vosso amor, arrebata consigo todos os tesouros que possui... Senhor, vós o sabeis, não tenho outros tesouros senão as almas que vos aprouve unir à minha. Tais tesouros, fostes vós que mos confiastes”. Teresa não seleciona as almas. É verdade que ela pensa nos pequenos. Ficaria até feliz se Deus pudesse encontrar almas que, em relação a ela, ganhassem em pequenez porque o critério será sempre a misericórdia divina. Pois foi do agrado do Pai revelar estas coisas aos pequeninos (Mt 11, 26).  Teresa recorre frequentemente às cartas de São Paulo. Também no tema da misericórdia de Deus, ela se reconhece no Apóstolo dos Gentios: “Jesus não chama os que disso são dignos, mas o que são de seu agrado, ou conforme diz São Paulo: ‘Deus tem compaixão de quem lhe apraz, e faz misericórdia a quem Ele quer aplicar misericórdia. Isto, portanto, não depende de quem quer, nem de quem corre, mas de Deus que se compadece”(Rm 9, 15-16).
O pensamento de Teresa não é arbitrário, mas atinge o mistério insondável da salvação. Por isso mesmo descobre a sua vocação de amor no coração da Igreja, como uma vocação profundamente apostólica: “Tenho vocação de ser apóstola... Quisera percorrer a terra, apregoar teu nome, e cantar em terra de infiéis tua gloriosa Cruz. Mas, ó meu Bem-Amado, uma única missão não me seria bastante. Quisera anunciar, ao mesmo tempo, o Evangelho pelas cinco partes do mundo até as ilhas mais remotas... Quisera ser missionária não só por alguns anos, mas quisera sê-lo desde a criação do mundo, e sê-lo até a consumação dos séculos... Mas, acima de tudo, quisera, ó meu amado Salvador, por ti quisera derramar meu sangue até a última gota...”.
De novo surge a tentação do ceticismo para quem a linguagem e a empolgação  de Teresa pode parecer uma fuga da vida cotidiana que ela levava no Carmelo de Lisieux. Ambiente em que não faltavam relacionamentos eivados de autoritarismo, mesquinhez e ciúme, que facilmente aumentam o volume da sua ressonância afetiva quando o espaço do mosteiro é reduzido pelo clausura, mas habitado por um número não pequeno de religiosas. As “alfinetadas” de que Teresa fala, fazem sonhar com horizontes mais amplos.  Mas o horizonte de Teresa não é feito de um sonho, mas é “o próprio Jesus, esta divina realidade” como ela sublinha. Ainda postulante, ela escreve para sua irmã Celina: “Antes de morrer pela espada, morramos às alfinetadas”.   As renúncias não procuradas que a cada momento se apresentam no relacionamento com as irmãs, principalmente no trato com as noviças por cuja formação Teresa é responsável, fazem-lhe descobrir e também ensinar melhor o seu pequeno caminho de amor. Teresa não quer saber de gestos heroicos de santidade. Para ela o ponto de referência é Jesus, que ela quer seguir amando. Jesus, o Filho de Deus que veio para fazer a vontade do Pai. Vontade que consiste em dar ao mundo o Filho, e nele o amor do Deus-Trindade. Um mês antes de sua morte, perguntaram-lhe se ficaria contente se soubesse que dentro de alguns dias iria morrer, ou se preferiria receber um aviso de que o seu sofrimento iria aumentar durante um longo período ainda. A resposta de Teresa: “Oh! não, absolutamente, não ficaria mais contente. A única coisa que me deixa contente é fazer a vontade do bom Deus”.  
Quando Teresa fala, reagindo às observações das suas irmãs que cuidam da enferma, as suas palavras não armam ao efeito. Seus comentários às admiradoras de sua paciência, beleza ou santidade, revelam um senso de humor que desloca a atenção para o seu Amado: “Bom, tanto melhor! Mas gostaria que o bom Deus o dissesse”.  

Celebremos o Amor de Deus
Santa Teresinha é Doutora do Amor que quer se doar. É a missão que ela descobriu.  
             
Quando ela começa a escrever a história de sua alma, ela afirma: “Só vou fazer uma coisa: começar a cantar o que devo repetir eternamente: As Misericórdias do Senhor!!!”.  Na segunda página do seu caderno, ela explica: “Compreendi que o amor de Nosso Senhor revela-se tanto na alma mais simples, que em nada resiste à sua graça, como na alma mais sublime. Na realidade, é próprio do amor rebaixar-se. Se todas as almas parecessem com as dos santos doutores que iluminaram a Igreja com a luz da sua doutrina, parece que Deus não desceria bastante ao vir até o coração deles. Mas criou a criança que nada sabe e só emite fracos gritos, criou o pobre selvagem que só tem como guia a lei natural e é até o coração deles que se digna descer; são as suas flores do campo cuja simplicidade O encanta... Descendo assim, Deus mostra sua infinita grandeza. Assim como o sol ilumina ao mesmo tempo os cedros e cada florzinha, como se ela fosse única sobre a terra, assim Nosso Senhor se ocupa particularmente de cada alma como se não houvesse outra igual. Como na natureza, todas as estações são determinadas de modo a fazer desabrochar, no dia marcado, a mais humilde margarida, assim tudo corresponde para o bem de cada alma”.

Preces
3. Em forma de prece vamos agradecer a Deus o dom que Ele nos fez em Santa Teresinha que, através da sua vida, nos apontou o caminho do amor.
4. Ler juntos as palavras de Jesus que foram escritas para todos nós:  “Assim como meu Pai me amou, eu também amei vocês. Se vocês obedecem aos meus mandamentos, permanecerão no meu amor, assim como eu obedeci aos mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor. Eu disse isso a vocês para que minha alegria esteja em vocês, e a alegria de vocês eja completa. O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros, assim como eu amei vocês”(Jo 14, 9-12).

Rezar o Pai Nosso.

Oração:
Ó Deus, criador de todas as coisas, volvei para nós o vosso olhar e, para sentirmos em nós a ação do vosso amor, fazei que vos sirvamos de todo coração, como nos mostrastes pelo exemplo de Santa Teresinha. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.

*Dom Frei Vital Wilderink, O Carm- Eremita Carmelita- foi vítima de um acidente de automóvel quando retornava para o Eremitério, “Fonte de Elias”, no alto do Rio das Pedras, nas montanhas de Lídice, distrito do município de Rio Claro, no estado do Rio de Janeiro. O acidente ocorreu no dia 11 de junho de 2014. O sepultamento foi na cidade de Itaguaí/RJ, no dia 12, na Catedral de São Francisco Xavier, Diocese esta onde ele foi o primeiro Bispo.

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