Raymond Gravel, padre da Diocese de
Joliette, Canadá.
A
administração terrena das pequenas coisas que nos são confiadas, nos prepara
não somente para administrar coisas mais importantes, mas para nos tornarmos
coproprietários com Deus: o bem dos outros torna-se o nosso próprio bem.
Referências bíblicas:
Eis o texto.
Primeira
leitura: Am 8,4-7
Segunda
leitura: 1 Tm 2,1-8
Evangelho:
Lc 16,1-13
Na
semana passada, através de três parábolas, o evangelista Lucas nos convidou
para dar uma atenção especial aos marginalizados, aos excluídos e aos
pecadores. Esta semana, através de outra parábola, ele nos convida a escolher
entre Deus e o Dinheiro com um D maiúsculo, isto é, Mammon, o deus sírio da
riqueza, um ídolo. Lucas qualifica Mammon de desonesto (adikia), isto é,
injusto (Lc 16,9), que é o contrário de Deus que é (dikia), isto é, justo. O
que isto quer dizer? O dinheiro seria ruim? A fé cristã seria uma fé que recusa
a riqueza e que louva a pobreza? Penso que não! A primeira leitura e o
evangelho servem para nos esclarecer sobre o dinheiro e sobre o lugar que deve
ocupar na vida dos cristãos.
1. Esta parábola do Evangelho de Lucas é
difícil, certamente, mas podemos tirar dela duas mensagens:
1- Proprietário ou servo.
O
administrador da parábola de Lucas, que perde sua administração, age como se
fosse o proprietário dos bens que lhe são confiados. O homem rico é Deus que
confia seus bens aos discípulos, aos dirigentes da Igreja. Os bens de Deus são
confiados para frutificarem e não para serem desperdiçados em proveito dos
administradores, que somos nós. Se, como administradores, nós nos arvoramos do
papel de proprietários, esquecemos que temos que prestar contas a Deus, que é o
verdadeiro proprietário. Por isso, a primeira sentença (Lc 16,10-12), onde há
uma equivalência entre as pequenas coisas, o Dinheiro injusto e os bens
alheios: expressões que designam aqui os bens desse mundo, das quais o homem
não é o proprietário, mas o administrador e o responsável, diz bem que se ele
se revela digno de confiança, em sua missão terrestre provisória, será
considerado digno de administrar as grandes coisas, o verdadeiro bem, seu
próprio bem. Com outras palavras, a administração terrena das pequenas coisas que
nos são confiadas, nos prepara, não somente para administrar coisas mais
importantes, mas para nos tornarmos coproprietários com Deus: o bem dos outros
torna-se o nosso próprio bem.
O
mesmo acontece com a Igreja. Nós somos os administradores do Reino e não seus
proprietários. O exegeta francês Jean Debruynne escreve: “A riqueza de Deus não
é como a riqueza dos homens; ela não é uma propriedade privada... Deus não pode
ser roubado, Deus só sabe amar. Todos têm o direito a Deus, mesmo aqueles de
outras religiões que nós consideramos muitas vezes como administradores
injustos”. Eu gostaria de acrescentar: quem somos nós, como Igreja, para
decidir dessa maneira?
2- Servir a Deus ou ao dinheiro.
Quando
servimos ao dinheiro, só podemos ser injustos, desonestos. A habilidade com que
o administrador da parábola serve ao dinheiro, não poderá ser utilizada para
servir a Deus? O Senhor da parábola elogia seu administrador desonesto, não por
sua desonestidade, mas por sua habilidade: “E o Senhor elogiou o administrador
desonesto, porque este agiu com esperteza. De fato, os que pertencem a este
mundo são mais espertos com a sua gente, do que aqueles que pertencem à luz”
(Lc 16,8). De sorte que o evangelho nos convida a nos servir de dinheiro para
servir a Deus: “E eu lhes declaro: ‘Usem o dinheiro injusto para fazer amigos,
e assim, quando o dinheiro faltar, os amigos receberão vocês nas moradas
eternas” (Lc 16,9). A segunda sentença da parábola assevera: “Nenhum empregado
pode servir a dois senhores, porque, ou odiará um e amará o outro, ou se
apegará a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro”
(Lc 16,13).
Como,
na Igreja, podemos nos servir de dinheiro para servir a Deus? Partilhando,
amando e construindo um mundo de justiça, de igualdade, de paz, devolvendo a
dignidade àqueles e àquelas que a perderam e estando a serviço do Reino de
Deus. Jean Debruynne prossegue em sua reflexão: “Hoje, a publicidade invade os
jornais, as rádios e as telas de televisão para conjugar dois verbos: primeiro
o verbo ter: ter dinheiro, ter relações, ter poder... e, depois, o verbo
aparecer: aparecer na televisão, aparecer o melhor, o mais forte, o mais
bonito... A fé tem apenas um verbo para conjugar: o verbo ser. Jesus nos diz,
em primeiro lugar, que a fé não é como o dinheiro. Ela não é alguma coisa que
se tem ou não se tem, que se ganha ou se perde. Crer é ser, é existir, é viver.
Jesus nos disse, na sequência, que o que nós temos, o que possuímos, mesmo
quando é pouco, deve servir para ser”.
2.
Devemos denunciar os ricos que esmagam os pequenos, exploram os pobres e os
dirigentes que se acham os donos dos bens que lhes são confiados.
O
profeta Amós, na primeira leitura de hoje, não tem papas na língua. No século
VIII a.C., sob o reinado do rei Jeroboão II, o comércio está em franca expansão
e o luxo se estende, agora, na capital, Samaria. O profeta Amós denuncia as
injustiças cometidas pelos grandes proprietários de terras contra os
trabalhadores. Aqueles os exploram e os esmagam até torná-los escravos: “Nós
podemos comprar os fracos por dinheiro, o necessitado por um par de sandálias,
e vender o refugo do trigo” (Am 8,6). E pior ainda: esses novos ricos estão com
pressa que o sábado termine para acelerar e continuar suas maldades: “Quando
vai passar a festa da lua nova, para podermos pôr à venda o nosso trigo? Quando
vai passar o sábado, para abrirmos o armazém, para diminuir as medidas,
aumentar o peso e viciar a balança?” (Am 8,5).
Para
terminar, gostaria de propor esta bela reflexão do século IV que nos vem de São
Basílio de Cesareia: “O que faço de errado, diz o avarento, guardando o que é
meu? Dize-me, de que modo é teu? Donde tiraste, tomando-o para teu sustento? És
como alguém que, indo ao teatro, se apoderasse do espetáculo e quisesse excluir
os que entrassem depois, pretendendo ser só teu aquilo que é comum a todos os
que se apresentam, conforme lhes parece bem. Assim são os ricos: apoderando-se
primeiro do que é de todos, tudo tomam para si por uma falsa ideia. Se cada um
tirasse para si o que lhe é necessário e entregasse aos indigentes o que sobra,
ninguém seria rico, ninguém seria pobre. Não saíste nu do útero e não
retornarás nu para a terra? Os bens que possuis, de onde vêm? Se dizes que
provêm do acaso, és ímpio, não reconhecendo o Criador e não dando graças ao
doador. Se, ao invés, admites que são de Deus, dize-me por que os recebeste. É
talvez injusto Deus, que nos distribui os meios de subsistência de modo
desigual? Por que tu és rico e aquele é pobre? Certamente para que tu pudesses
receber a recompensa da bondade da fiel administração e aquele pudesse
conseguir o magnífico prêmio da paciência”.
We bring to Him all are simple, but important tools, and we have received the gift of faith is not to hide it, but to spread it, so that it can illuminate the path of so many brothers.”
ResponderExcluirAddress d el santo padre francisco. to the participants in the pontifical mission.