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terça-feira, 17 de junho de 2014

“Jesus não quer príncipes, mas servidores”, diz Papa Francisco em entrevista

O Papa Francisco não acredita que seja um iluminado, mas cativou o mundo sem deixar ninguém indiferente, quer seja católico ou não. É o que demonstra na entrevista que deu a Henrique Cymerman e que no domingo foi veiculada pela Cuatro, a primeira para uma televisão espanhola. Fonte: http://bit.ly/1kYJMTE
Israel e Palestina, ponto de partida na qual Bergoglio aborda muitos assuntos, alguns fundamentais para a Igreja. Questões como a via soberanista na Catalunha. Além de grandes reflexões, também fala da Copa do Mundo.
A reportagem está publicada no sítio espanhol Religión Digital, 16-06-2014. A tradução é de André Langer.
O Papa, sobre seu encontro com os líderes da Palestina e Israel: “Não era um ato político”
“Não era um ato político, mas religioso. A oração também é um ato político com maiúscula. Alguém dizia que com a oração se faz pouco, mas sem a oração se faz menos. Na reunião presidimos todos, até o homem que tocava o violino”.
O Papa Francisco: “Não sei se sou revolucionário”
“Para mim, a grande revolução é ir às raízes, reconhecê-las e ver o que essas raízes querem dizer nos dias de hoje. Não sei se sou revolucionário, mas gosto de ir às nossas raízes da identidade cristã, judaica... e a partir daí dialogar com os desafios que vão se apresentando. Não há contradição entre ser revolucionário e ir às raízes. A maneira de fazer verdadeiras mudanças é a partir da própria identidade.”

Sobre a perseguição católica atual: “Há mais cristãos mártires do que naquela época”
“Estou convencido de que a perseguição contra os cristãos, hoje, é mais forte que nos primeiros séculos da Igreja. Hoje, há mais cristãos mártires do que naquela época.”
“Não vou saudar um povo e dizer-lhe que o quero bem dentro de uma lata de sardinhas”
“Sei que pode me acontecer alguma coisa, mas isso está nas mãos de Deus. Recordo que no Brasil haviam preparado um papamóvel fechado, com vidros, mas eu não posso saudar um povo e dizer-lhe que gosto muito dele dentro de uma lata de sardinhas, mesmo que seja de vidro. Para mim, isso é um muro. É verdade que algo pode me acontecer, mas sejamos realistas: na minha idade, não tenho muito a perder.”

O pontífice, sobre as riquezas da Igreja: “Não se pode entender o Evangelho sem a pobreza”
“Não se pode entender o Evangelho sem a pobreza. O Povo de Deus perdoa um pastor, um padre, que tenha tido um deslize afetivo. Perdoa-o. Que tenha tomado um pouquinho a mais de vinho. Perdoa-o. Mas nunca vai lhe perdoar que esteja atrás do dinheiro ou que maltrate as pessoas. Curioso como o povo tem o olfato do que Deus pede a um pastor. Jesus não quer que sejamos príncipes, mas servidores.”

Sobre as mudanças: “Estou apenas cumprindo o que os cardeais refletiram”
“Quero deixar claro que não tenho nenhuma iluminação, que não tenho nenhum projeto pessoal, porque nunca pensei que ficaria aqui. O que estou fazendo é cumprir o que os cardeais refletiram nas Congregações Gerais antes do conclave. Ali nos reunimos todos os dias para discutir os problemas da Igreja. Daí sai uma série de reflexões e conselhos para o próximo papa. Eu os estou cumprindo.”

“Às vezes, pela religião chegamos a contradições muito sérias”, declarou Francisco
“É uma contradição. É como se me dissessem: ‘Este homem é um bom filho, bate apenas três vezes por dia na mãe’. Em perspectiva histórica, os cristãos, às vezes, praticaram a violência em nome de Deus. Chegamos, às vezes, pela religião, a contradições muito sérias, muito graves.”
Após o abraço em frente ao Muro das Lamentações: “É possível a amizade entre as três religiões”
“Tomei uma decisão e Skorka sabia. Quis ir também com um bom amigo islâmico. Um homem que conhece muito bem o Islã. Como os amigos não se fazem com fotocópias cada um é diferente. Quero-os aos dois um montão e um não têm nada a ver com o outro. Disse: ‘Aqui estamos as três religiões e é possível a amizade para dar testemunho’. Conseguimos. Foi um grito de vitória porque tínhamos a esperança de poder fazer isso”.

“Há pessoas que negam o Holocausto”, disse sobre o antissemitismo
“Não saberia explicar porque existe, mas creio que está muito unido, em geral, à direita. O antissemitismo costuma aninhar-se melhor nas correntes políticas de direita que de esquerda, não? E continua até hoje. Há, inclusive, quem negue o holocausto, uma loucura.”

Assim recorda a Segunda Guerra Mundial
“Dá-me um pouco de urticária existencial quando vejo que todos atacam a Igreja e Pio XII... E as grandes potências? As grandes potências conheciam perfeitamente a rede ferroviária dos nazistas que levavam os judeus aos campos de concentração. Tinham fotos. Mas não bombardearam esses trilhos. Falemos de tudo um pouquinho. Creio que é preciso ser muito justo neste tema.”
             
Dos políticos: “Os políticos jovens falam dos mesmos problemas, mas com uma música diferente”
“Os políticos jovens talvez falem dos mesmos problemas, mas com uma música diferente, e gosto disso. Isso me dá esperança, porque a política é uma das formas mais elevadas do amor, da caridade, porque leva ao bem comum. Uma pessoa que, podendo fazê-lo, não se envolve com o bem comum, é egoísta; ou que usa a política para o bem próprio, é corrupção.”

O que acha do conflito com a Catalunha?
“Qualquer divisão me preocupa. Há independência por emancipação e há independência por secessão. A independência por secessão é um desmembramento e, às vezes, é muito óbvia. Há povos com culturas tão diversas que nem com cola pegam. Eu me pergunto se é tão claro em outros casos, em outros povos que até agora estiveram juntos. É preciso estudar caso a caso. Haverá casos que são justos e casos que não são justos, mas a secessão de um país sem um antecedente de unidade forçada é preciso tomá-lo com muitas pinças e analisá-lo caso a caso.”

Sobre a Copa do Mundo: “Espero poder ver algum jogo”

“Os brasileiros me pediram neutralidade e cumpro com minha palavra, porque o Brasil e a Argentina sempre são rivais. Espero poder ver algum jogo. Fiz um vídeo para a abertura porque se deve aproveitar um acontecimento lúdico para criar a cultura do encontro, da fraternidade.”.
O Pontífice gostaria de ser recordado como “um cara bom”
“Não pensei nisso, mas gosto quando alguém, recordando outra pessoa, diz: ‘Era um cara bom, fez o que pôde, não foi tão ruim’. Com isso me conformo.”

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