Frei Fernando Millán
Romeral, O. Carm. Prior Geral.
Neste ano, no qual a Igreja convoca a
Vida Religiosa, em suas diversas formas e expressões, a refletir sobre a
própria identidade e missão, o Santo Padre nos convida a assumir três atitudes
fundamentais: “olhar com gratidão o passado” e recordar a própria história como elemento necessário para manter
viva nossa identidade; “viver com
paixão o presente”, deixando-nos interpelar pelo Evangelho e fazendo dele o
referencial ultimo para o radicalismo de vida a ser testemunhado; “abraçar com esperança o futuro”,
radicados naquela “esperança que não desilude”, com a consciência de que o
Espírito continua a impelir esta porção do Povo de Deus, que é a vida
religiosa, a fazer grandes coisas. Neste contexto, a mensagem e o testemunho de
Santa Teresa podem servir como fonte de inspiração para acolhermos com
responsabilidade e alegria os grandes desafios aos quais estamos submetidos e
construir respostas corajosas em meio às vicissitudes do tempo e da história.
Com sabedoria e maestria, ela soube conjugar o passado, o presente e o futuro para dar luz à sua grande obra de
serviço à Igreja.
Aproximamo-nos sempre de Teresa com santa reverência, aceitando o convite a
entrar em diálogo profundo e sincero com sua experiência pessoal da qual emerge
a autoridade do seu magistério espiritual. Tomados pela mão, na qualidade de
aprendizes, devemos nos deixar conduzir por ela, fazendo nosso o seu itinerário
humano e espiritual, descobrindo com ela as vias para a maturação de nossa
vocação, radicados em nossa existência concreta, muitas vezes atormentada, mas
escolhida por Deus como percurso necessário para a conquista daquela liberdade
que se transforma em experiência de pertença a um único e inalienável amor.
Santa Teresa
viveu intensamente sua vida em comunhão com os grandes dramas eclesiais do seu
tempo. Sentiu o peso da mediocridade que muitas vezes invade a vida daqueles
que assumiram a responsabilidade de viver com radicalidade a própria vocação.
Como resposta pessoal, ela travou batalhas interiores para reencontrar forças
para viver a audácia de uma fidelidade sem restrições. Deixou-se encontrar por
aquele que sempre leva a sério o desejo genuíno de fidelidade do coração
humano, descobriu-se amada apesar de suas fraquezas, reformou-se e compreendeu
que não podia conter em si a novidade de sua descoberta. Encontrou-se com
outros que compartilhavam o seu desejo e foi ousada em sua capacidade de romper
com os esquemas de uma vida religiosa por demais estabelecida. Como fruto
maduro do encontro entre natureza e graça, descobriu a alegria de ser discípula
e, com corajosa simplicidade buscou as fontes de uma vida “sem mitigações” como
caminho para a reforma e renovação do Carmelo.
Depois de cinco
séculos, encontramo-nos, como Santa Teresa, diante de encruzilhadas que nos
desafiam em todos os níveis: pessoal, comunitário e institucional. O mundanismo
material e espiritual, invocado pelo Santo Padre como uma das doenças de nossa vida
de discípulos, armou sua tenda e entre nós, roubando-nos a alegria, a paixão e
a coragem da fidelidade, transformando nossa existência em um “empasto” de
superficialidade e mediocridade. Como Santa Teresa, se quisermos recuperar a
beleza de nossa vida, devemos assumir o esforço de “nadar contra a corrente”,
reformando-nos para reformar, recuperando a beleza e a alegria de nossa
condição de discípulos, ofuscada pela tentação de autossuficiência e pela
ilusão de que, com nossas ideias e nossos talentos, podemos atingir a perfeição
em nossa vida.
Santa Teresa nos
ensina a via régia da humildade, virtude adquirida depois de muito penar e fruto
maduro da consciência de que é Deus quem tem em mãos o timão de nossa
existência e de nosso projetos. Resta-nos, finalmente, deixar brotar do nosso
coração a pergunta-resposta com a qual Teresa exprime sua disponibilidade sem
reservas aos caminhos de Deus: “Vossa
sou, para vós nasci, que mandais fazer de mim”? Sua vida, sua doutrina e seu carisma
espiritual, marcados pela singular capacidade de “penetrar com profundidade o
mistério de Cristo e o conhecimento da alma humana” (Paulo VI), possuem uma
atualidade incontestável para os homens e mulheres de nosso tempo marcados por
aquela inquietação interior que os impele a buscar um “algo a mais” como
qualificativo para a própria experiência de fé.
Que, Santa
Teresa, mestra de oração e de vida, com seu exemplo e sua doutrina, incite os
vossos corações a percorrer a fascinante estrada da intimidade com Deus, que se
transforma em serviço e missão para a Igreja e para o mundo.
Fraternalmente
no Carmelo,
Frei Fernando Millán Romeral, O. Carm.
Prior Geral.
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