The New York Times
Frank Bruni
Como um vendedor de batatas Pringles
soando alarme a respeito da obesidade, o papa Francisco assumiu o manto de
feminista na semana passada.
Foi uma má combinação épica de
mensageiro e mensagem, e digo isso como alguém que é grato por este papa, o
admira enormemente e acredita que uma mudança de tom, mesmo sem uma mudança dos
ensinamentos, tem significado e é digna de celebração.
Mas uma mudança de tom em desafio ao
fato deve ser apontada (e criticada). Nem Francisco nem qualquer autoridade do
baluarte do direito masculino conhecido como Vaticano pode afirmar de modo
crível uma preocupação com a paridade dos sexos. A cozinha deles é suja demais
para que possam criticar as manchas de ketchup na dos outros.
Na verdade, Francisco foi além da
preocupação. Ele expressou ultraje, chamando de "puro escândalo" o
fato de as mulheres não receberem remuneração igual por trabalho igual.
Ele deixou de fora a parte sobre as
mulheres na Igreja Católica Romana nem mesmo terem uma chance de trabalho
igual. Remuneração não é a questão principal quando você é impedido de exercer
certas funções e é profundamente sub-representado em outras.
Remuneração não é a questão principal
quando o simbolismo, rituais e o vocabulário de uma instituição exaltam os
homens acima das mulheres e quando contestações a esse desequilíbrio são
recebidas com a insistência de era assim e sempre será –-que o hábito está
acima do esclarecimento e do bom senso.
Vamos ser claros. Apesar do serviço
notável que a Igreja Católica realiza, ela é um dos patriarcados mais
inabaláveis e dominantes do mundo, com princípios que não favorecem a
igualdade.
Para as mulheres terem um tratamento
justo na força de trabalho, elas precisam ao menos de algum grau de liberdade
reprodutiva. Mas os bispos católicos nos Estados Unidos fazem enorme lobby
contra a exigência da nova lei de saúde de que empregadores como escolas e
hospitais religiosos incluam contracepção no plano de saúde de seus
funcionários.
Não importa que apenas uma pequena
minoria de católicos americanos siga a proibição formal da igreja ao controle
da natalidade artificial. Alguns líderes católicos não apenas se agarram a essa
restrição caduca; eles a promovem, apesar de seu efeito desproporcional sobre a
autonomia das mulheres.
E como sua vilificação da Conferência da
Liderança das Mulheres Religiosas, uma organização que representa 80% das
freiras americanas, combina com igualdade das mulheres? Em 2012, o grupo foi
condenado pelo Vaticano e colocado sob o controle de três bispos encarregados
de limpá-lo de suas inclinações "feministas radicais", incluindo mais
atenção aos pobres do que a costumes sexuais.
Para seu crédito, Francisco declarou uma
trégua com as freiras no mês passado. Também para seu crédito, ele sinalizou
solidariedade para com as mulheres que tentam limitar o tamanho de suas
famílias e pediu aos líderes da igreja para não se envolverem demais em
assuntos como aborto e casamento de mesmo sexo.
E a tendência no Vaticano e na Cidade do
Vaticano aparentemente é de ter um maior número de funcionários do sexo
feminino, apesar de em 2014, segundo a agência de notícias "The Associated
Press", elas ocuparem menos de 20% das vagas de trabalho. Não precisava ser
assim, mesmo considerando a exclusão das mulheres do sacerdócio.
Mas a recusa da igreja em seguir algumas
das outras denominações cristãs e ordenar mulheres mina qualquer progresso na
direção da igualdade que ela anuncia ou tenta. O sexismo está incorporado em
sua estrutura, em seu fluxograma.
Homens, mas não mulheres, rezam a missa.
Homens, mas nunca as mulheres, chegam a cardeais ou a papa. O clero masculino
geralmente é tratado como "padre", que conota autoridade, enquanto as
mulheres nas ordens religiosas costumam ser tratadas como "irmãs",
que não.
E as coisas poderiam ser diferentes.
Tradições mudam. História e mitologia cedem a novas interpretações.
Sim, a Bíblia diz que todos os 12
apóstolos de Jesus Cristo eram homens. Mas além dos 12 há Maria Madalena, a
quem Jesus supostamente apareceu primeiro após a Ressurreição. O papel dela não
é fundamental para o nascimento da igreja?
Não é mais importante que haja
sacerdotes suficientes para ministrar a Eucaristia aos católicos do que todos
os padres serem homens?
Será que a igreja pode se dar ao luxo de
alienar uma geração inteira de mulheres jovens, perplexas diante de sua
intransigência?
"Elas cresceram em um mundo onde
todas as portas foram abertas para elas", disse Kathleen Sprows Cummings,
diretora do Centro Cushwa para o Estudo do Catolicismo Americano, na
Universidade de Notre Dame. "E há uma desconexão quando veem a igreja sem
nenhuma liderança feminina –-no mínimo, não são elas que estão no altar."
Francisco não sancionou nenhuma discussão
sobre colocá-las lá. Quando pressionado sobre isso por uma repórter italiana no
ano passado, ele a lembrou que "as mulheres vieram da costela".
Era uma provocação? Ele riu e disse que
sim. Mas a metáfora permanece e coloca as mulheres como ramificações, até mesmo
como uma reflexão tardia.
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