"Repetidas vezes enfatiza o Papa Francisco que o padre “deve ter cheiro de
ovelha”, quer dizer, alguém que está no meio de seu “rebalho” e caminha com
ele. Cito apenas dois textos emblemáticos, um proferido ao episcopado italiano
no dia 16 de maio de 2016 onde diz:”O padre não pode ser burocrático mas alguém
que é capaz de sair de si mesmo, caminhando com o coração e o ritmo dos
pobres”. O outro aos bispos recém sagrados no dia 18 de setembro de 2016: 'o
pastor deve ser capaz de escutar e de encantar e atrair as pessoas pelo amor e
pela ternura'", escreve Leonardo Boff, teólogo, filósofo e
escritor.
Eis o artigo.
Nos dias 20-24 de março se
realizou em Juazeiro do Norte, Ceará, o Vº Simpósio Internacional Padre Cícero com o tema “Reconciliação…e agora?”
Fiquei admirado pelo alto nível das exposições e das discussões com a presença
de pesquisadores nacionais e estrangeiros. Tratava-se da reconciliação da
Igreja com o Pe. Cícero que sofreu pesadas penas canônicas,
hoje questionáveis, sem jamais se queixar, num profundo respeito às autoridades
ecclesiasticas e reconciliação com os milhares de romeiros que o consideram um
santo.
Indiscutivelmente o Pe. Cícero Romão Batista (1844-1034),
por suas múltiplas facetas, é uma figura polêmica. Mas mais e mais as críticas
vão se diluindo para dar lugar àquilo que o Papa Francisco através do Secretário de Estado Card. Pietro Parolin, numa carta ao bispo
local Dom Fernando Panico de 20 de outubro de 2015,
expressamente diz que no contexto da nova evangelização e da opção pelas
periferias existenciais a “atitude do Pe. Cícero em acolher a todos,especialmente aos
pobres e sofredores, aconselhando-os e abençoando-os, constitui, sem dúvida, um
sinal importante e atual”.
O Pe. Cicero corporifica o tipo de padre adequado à
fé de nosso povo, especialmente nordestino. Existe o padre da instituição
paróquia, classicamente centrada no padre, nos sacramentos e na transmissão da
reta doutrina pela catequese. É um tipo de Igreja que se auto finaliza e com
parca incidência social em termos de justiça e defesa dos direitos humanos
especialmente dos pobres.
Entre nós surgiu um outro
tipo de padre como o Pe. Ibiapina (1806-1883), que foi magistrado e
deputado federal, tendo abandonado tudo para, como sacerdote, colocar-se a
serviço dos pobres nordestinos, como o Pe. Cícero, o Frei Damião, Pe. José Comblin entre outros. Eles inauguraram um
outro tipo ação religiosa junto ao povo. Não negam os sacramentos, porém, mais
importante é acompanhar o povo, defender seus direitos, criar por toda parte
escolas e centros de caridade (de atendimento), aconselhá-lo e reforçar sua
piedade popular. Esse é o tipo de padre adequado à nossa realidade e que o povo
aprecia e necessita.
Esse era também o método do Pe. Cícero que se desdobrava em três vertentes:
primeiro conviver diretamente com o povo, cumprimentando e abraçando a todos;
em seguida visitar todas as casas dos sítios, abençoando a todos, a criação dos
animais e as plantações; por fim orientar e aconselhar o povo nas pregações e
novenas; ao anoitecer reunia as pessoas diante de sua casa e distribuía bons
conselhos e encaminhava para o aprendizado de todo tipo de ofícios para
tornarem independentes.
Neste contexto o Pe. Cícero se antecipou ao nosso
discurso ecológico com seus 10 mandamentos ambientais, válidos até os dias de
hoje (“não derrube o mato nem mesmo um só pé de pau” etc).
O Pe. Comblin, eminente teólogo,
devoto do Pe. Cícero e que quis ser enterrado ao lado do Pe. Ibiapina escreveu com acerto:”O Padre Cícero
adotou amorosamente os pobres e advogou a causa dos nordestinos oprimidos,
dedicando-lhes incansavelmente 62 anos de vida. E o povo pobre o reconheceu, o
defendeu e o consagrou, continuando a expressar-lhe o seu devotamento, porque viu
e vê nele o Pai dos Pobres. Antecipou em muitos anos as opções da Igreja na
América Latina.
É impossível negar a
sincera opção pelos pobres, como foi dito por um deles:”Meu padrinho é padre
santo/como ele outro não há/ pois tudo o que ele recebe/ tudo de esmola dá”(O Padre Cícero de Juazeiro,
2011, p.43-44).
Curiosamente, se
recolhermos os muitos pronunciamentos do Papa Francisco sobre o tipo de padre que projeta e
quer, veremos que o Pe. Cícero se enquadra. à maravilha, ao modelo
papal. Não há espaço aqui para trazer a farte documentação que se encontra no
meu blog que recolhe minha intervenção em Juazeiro: “O Padre Cícero à luz do Papa Francisco”.
Repetidas vezes enfatiza o Papa Francisco que o padre “deve ter cheiro de
ovelha”, quer dizer, alguém que está no meio de seu “rebalho” e caminha com
ele. Cito apenas dois textos emblemáticos, um proferido ao episcopado italiano
no dia 16 de maio de 2016 onde diz:”O padre não pode ser burocrático mas alguém
que é capaz de sair de si mesmo, caminhando com o coração e o ritmo dos
pobres”. O outro aos bispos recém sagrados no dia 18 de setembro de 2016:”o
pastor deve ser capaz de escutar e de encantar e atrair as pessoas pelo amor e
pela ternura”.
Estas e outras qualidades
foram vividas profundamente pelo Pe. Cícero,
tido como o Grande Patriarca do Nordeste, o Padrinho Universal, o Intercessor
junto a Deus em todos os problemas da vida, o Santo cuja intercessão nunca
falha. Os romeiros e
devotos sabem disso. E nós secundamos esta convicção. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br
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