Eis
o artigo.
Dia 28 de março de 2015 faz 500 anos,
que a mística e reformadora da Ordem Carmelita, Teresa d´ Ávila (1515-1582),
nasceu na Espanha. Em 1622, quarenta anos depois de sua morte, Teresa foi
canonizada pelo papa Gregório XV. Em 27 de setembro de 1970, Paulo VI proclamou
Teresa Doutora da Igreja. É bom lembrar, que ainda em 1923, o papa Pio XI
considerou uma doutora da Igreja impossível: “obstat sexus”.
Por ocasião do 4º centenário da reforma
teresiana e da canonização de Teresa, no Carmelo de Milão, em agosto de 1962, o
então cardeal Montini, falou do segredo do caminho contemplativo de Teresa, de
sua audácia, de seu modo severo e despojado de aparatos exteriores, de sua
busca da comunhão com a fonte, com a essência da vida, que é Deus: “É na
audácia de uma forma de vida como esta que consiste a dedicação. Dedicação quer
dizer renúncia. [...] É a pérola da busca vigilante e contemplativa de Deus”.
A biografia de Teresa é o espelho de uma
Espanha conturbada e contraditória. Em 1485, seu avô, Juan Sanchez de Toledo,
descendente de Conversos, como foram chamados judeus convertidos ao
cristianismo, foi condenado à penitência pública pela Inquisição espanhola por
causa de práticas judaizantes. Na época, Alonso, o pai de Teresa, tinha cinco
anos.
Na Espanha dos séculos XV e XVI, os
direitos civis eram uma prerrogativa dos cristãos ou dos convertidos ao
cristianismo. Ao mesmo tempo, os judeus convertidos eram suspeitos de serem
conversos oportunistas que clandestinamente praticavam sua antiga religião.
Esse clima de suspeitas era o motivo que, cinco anos depois de sua penitência
pública, fez a família de Juan Sanchez migrar de Toledo para Ávila, onde se
integrou na classe de comerciantes bem sucedidos. No decorrer dos anos, o nome
Sanchez, que indicava a origem judaica, foi substituído por um título comprado
de nobreza, medidas que protegeram a família de Teresa. Ela mesma se chamou nos
primeiros decênios de sua vida: Doña Teresa de Cepeda y Ahumada, adotando os
sobrenomes da linhagem materna.
A expulsão dos judeus dos territórios da
coroa espanhola em 1492, pelos Reis Católicos, Fernando e Isabela, mostra como
naquele país eram importantes a certidão de batismo e o certificado de nobreza.
Mas a história se vingou da Igreja católica espanhola. A lei iníqua do governo de
Mendizábal, de 1835, efeito tardio da Revolução Francesa, despojou a Igreja de
suas propriedades e todas as Ordens Monásticas foram proibidas. Os conventos
carmelitas desapareceram por completo da Espanha e só em 1875, com a
restauração da monarquia e a chegada de Alfonso XII, iniciou-se a restauração
carmelitana naquele país.
Quem
era Santa Teresa d´Àvila?
O carmelita frei Maximiliano Herráiz
distingue três etapas na vida de Teresa: a primeira, na casa paterna, vai até
os vinte anos (1515-1535), a segunda abarca 27 anos de vida religiosa
carmelita, no Mosteiro da Encarnação, em Ávila. Em sua inquietude espiritual,
Teresa fez um voto de que haveria de seguir sempre o caminho da perfeição. Numa
noite do mês de setembro de 1560, Teresa d´ Ávila decidiu reunir um grupo de
freiras na sua cela e, tomando a inspiração primitiva da Ordem do Carmo e a
reforma descalça de São Pedro de Alcântara, propôs-lhes a fundação de um
mosteiro de tipo eremítico, proposta que se realizou em 1562.
No terceiro período, de 1562 até 1582,
Teresa se encontra com João da Cruz (1567), ele com 25 anos e ela com 52. Entre
ambos nasceu uma intensa afinidade mística e prática reformadora. Para Teresa
são anos de fundações de mosteiros de monjas e monges, de reformas (carmelitas
descalços!), de conflitos e de produção literária de textos norteadores para as
suas reformas. Todos os livros de Teresa foram escritos nessa época.
Entre os Carmelitos da Antiga
Observância e os Carmelitos Descalços surgiram conflitos profundos. Em 1577,
Teresa sofreu cárcere domiciliar em Toledo e João da Cruz foi encarcerado pelos
Carmelitas da Antiga Observância. Para apaziguar a situação interna da Ordem,
em 1593, o papa Clemente VIII concedeu total autonomia ao ramo dos Carmelitas
Descalços. Depois de sua morte, o culto à Santa Teresa se espalhou pela Espanha
durante a década de 1620. Ao lado de Santiago Matamoros, Teresa foi declarada
padroeira da Espanha.
Em seu “Caminho de Perfeição”, de 1567,
Teresa de Jesus, como também foi chamada, apresentou às suas irmãs seu ideal da
vida carmelita: “Não penseis, minhas amigas e irmãs, que serão muitas as coisas
a serem recomendadas. [...] O primeiro é o amor de umas para com outras; o
segundo, o desapego de todo criado; o terceiro, a verdadeira humildade”.
Humildade significa, segundo o papa Francisco: vencer a autorreferencialidade e
as atitudes apologéticas. E Teresa explica: “Vede como respondeu o Senhor pela
Madalena em casa do fariseu e quando foi acusada pela própria irmã. Não vos
tratará com tanto rigor como a ele próprio, que já estava na cruz, quando
permitiu que um ladrão falasse por ele” (Caminho, XV,7).
Teresa é uma peregrina na via sacra
interna e externa. Não só os opositores de suas reformas do Carmo, os conflitos
de sua família e as contradições de seu país e de sua época, também as fases de
ateísmo espiritual, de medo do inferno e de deserto transformaram etapas de sua
vida em purgatório. No sofrimento se tornou sábia, autocrítica e humilde. Das
tempestades saiu de cabeça erguida e, segundo o testemunho de seus
contemporâneos, nunca perdeu a sua simpatia humana e seu foco espiritual. Foram
os encontros com seu amigo Jesus que transformaram seus gritos em canção: “Nada
te perturbe, nada te espante [...]”. O que pode parecer alienante em Teresa são
sinais de emancipação de uma mulher que, com sua humildade e seu despojamento,
nadou contra muitas correntes de sua época. Como padroeira da Espanha e Doutora
da Igreja começou a abalar o machismo de Santiago (“Matamoros” que nas Américas
se tornou “Mataíndios”), e das Faculdades Teológicas. Mesmo depois de 500 anos,
suas vitórias ainda estão por vir. “Santa Teresa de Jesus, mística militante,
rogai por nós!”
Fonte:
http://www.ihu.unisinos.br
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