Se o educador é tolhido, jovens se tornam presas fáceis do extremismo
Sociólogo e autor de livros
didáticos, é membro da Comunidade Reinventando a Educação (Core)
Quem trabalha na educação sabe
há muito tempo. Se mostrarmos às equipes de limpeza e manutenção das escolas a
foice e o martelo, e perguntarmos se já viram o símbolo rabiscado em alguma
porta de banheiro ou carteira, dirão que não. Mas, se exibirmos uma suástica e fizermos a mesma pergunta, imediatamente
responderão que a veem todos os dias.
Enquanto muitos gritavam
contra suposta doutrinação esquerdista nas escolas, as suásticas riscadas nos móveis já indicavam o verdadeiro perigo à espreita.
A princípio, atribuíamos os desenhos a uma certa tolice de adolescentes
irresponsáveis e sua eterna ânsia de "causar". Não mais.
A violência que adentrou as escolas e as ameaças virtuais que atormentam pais, alunos e educadores têm
clara inspiração em ideologias nazifascistas, cuja expansão se deu
simultaneamente, não por acaso, à difusão do discurso de criminalização da
atuação docente, aqui conhecido pelo slogan "escola sem partido".
Tal discurso está muito
presente nos EUA, onde movimentos reacionários organizados atuam para proibir
livros com temática considerada "indecente" ou "divisiva",
impedir a discussão de assuntos como escravidão e alterar o currículo em vários
temas. São as "Mães pela Liberdade", a "Fundação para os Direitos
Parentais" ou, a mais explícita, "Não à Esquerda na Educação".
Paralelamente ao crescimento desses grupos, multiplicam-se nas escolas estadunidenses os episódios de massacre.
Não é coincidência. Quando se
impede ou se dificulta o trabalho dos professores, a mente fértil e atormentada
dos adolescentes vira presa fácil de discursos radicais, tão mais sedutores
quanto mais violentos. Eles são atraídos por valores contrários a qualquer
vínculo social solidário. Racismo, misoginia, homofobia e apologia às armas são temas
comuns em fóruns virtuais e chats de jogos online, entre outros espaços.
O trabalho da educação escolar
é primordialmente o de ensinar a conviver com o outro. É na escola que se
aprende a resolver conflitos por meio da mediação e do diálogo, com regras estabelecidas
publicamente. Apenas no espaço escolar desenvolvemos de forma ampla valores
como respeito, tolerância e solidariedade. O lugar-comum de que a escola forma
cidadãos tem esse significado: preparar as novas gerações para a vida coletiva,
algo que o ultraindividualismo e sua lógica —esta sim divisiva, perigosa e
violenta— não conseguem compreender (ou aceitar).
Para além do que se
convencionou chamar de habilidades socioemocionais, no entanto, o currículo escolar tem conteúdos
que alertam para o perigo do obscurantismo e valorizam a humanização das
relações. Fazer uma leitura incisivamente crítica do modelo colonial
implementado nas Américas e da escravização dos povos africanos em seu bojo,
por exemplo, não é doutrinação ideológica, mas sim a apresentação aos alunos do
que as ciências sociais produziram e constataram. As injustiças sociais que
herdamos são iluminadas como tal, pela ação dos professores, evitando leituras
equivocadas que podem levar à normalização da barbárie.
Se o professor é tolhido ou
silenciado, os adolescentes tornam-se potenciais agentes do extremismo.
Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
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