O artigo publicado há dois dias pelo
bispo de Mostar (Bósnia e Herzegovina), sob cuja jurisdição Medjugorje
atualmente se encontra, é muito significativo, começando pelo título. “As
aparições dos primeiros sete dias em Medjugorje” é uma acusação com a qual dom
Ratko Peric, desde sempre contra qualquer credibilidade ao fenômeno, procura
desmantelar as “aparições” precisamente em sua primeira fase, utilizando
material já conhecido e publicado há muitos anos. Essa fase sobre a qual a
comissão criada por Bento XVI e conduzida pelo cardeal Camilo Ruini reconheceu,
ao contrário, elementos sobrenaturais. O relatório entregue a Francisco, em
2014, fruto do trabalho de quatro anos, sugeria ao Pontífice que somente
procedesse com o reconhecimento do fenômeno das primeiras semanas. A reportagem
é de Andrea Tornielli, publicada por Vatican Insider, 28-02-2017. A tradução é
do Cepat.
Contudo, o que mais surpreende é a
coincidência temporal. Dom Peric publicou o artigo a pouco tempo da chegada do
enviado especial do Papa, o arcebispo de Varsóvia-Praga Henryk Hoser,
encarregado em “adquirir conhecimentos mais profundos sobre a situação pastoral
daquela realidade e, sobretudo, sobre as exigências dos fiéis que ali chegam em
peregrinação e, com base nelas, sugerir eventuais iniciativas pastorais para o
futuro”. Sabe-se que o mandato de Hoser não está relacionado com a
autenticidade das aparições, mas apenas com o cuidado pastoral dos fiéis e com
a solução dos antigos problemas que, há tempo, na região, opõem os frades franciscanos,
titulares da paróquia, ao bispo de Mostar.
Em seu artigo, Peric critica qualquer
tendência a considerar autêntico o fenômeno de Medjugorje: “A posição desta
Cúria por todo este período foi clara e decidida: não se trata de verdadeiras
aparições da Beata Virgem Maria”. E critica exatamente as conclusões (nunca
publicadas) da comissão Ruini. “Ainda que, às vezes, se tenha dito que as
aparições dos primeiros dias poderiam ser consideradas autênticas e que,
depois, haveria se somado uma sobreposição por outros motivos, principalmente
não religiosos, esta Cúria promoveu a verdade também em relação a estes
primeiros dias. Após ter transcrito as gravações das entrevistas ocorridas, na
primeira semana, no escritório paroquial de Medjugorje, entre o pessoal pastoral
e os pequenos e pequenas que tinham afirmado terem visto a Virgem, com plena
convicção e responsabilidade expomos os motivos pelos quais nos parece evidente
a não autenticidade dos supostos fenômenos. Se a verdadeira Virgem, Mãe de
Jesus, não apareceu (como de fato não aconteceu), então é necessário aplicar a
tudo as seguintes fórmulas: “supostos videntes”, “supostas mensagens”, “suposto
sinal visível” e “chamados secretos””.
Com base nas gravações das entrevistas
desses primeiros dias, o bispo de Mostar afirma que surge: “uma figura ambígua.
A figura feminina que teria aparecido em Medjugorje se comporta de maneira
completamente diferente da verdadeira Virgem, Mãe de Deus, nas aparições
reconhecidas até agora como autênticas pela Igreja: normalmente não fala
primeiro; ri de maneira estranha; diante de certas perguntas desaparece e
depois retorna; obedece aos ‘videntes’ e ao pároco que a fazem descer da
montanha à igreja, contra sua vontade. Não sabe com certeza por quanto tempo
aparecerá; permite que alguns presentes pisoteiem seu véu estendido pelo chão e
que toquem seu vestido e seu corpo. Esta não é a Virgem evangélica”.
Peric ressaltou o ‘estranho tremor’ que
um dos videntes, Ivan Dragicevic, “na conversa com o capelão, frei Zrinko
Cuvalo (1936-1991), disse ter percebido, no primeiro dia, um ‘tremor’ das mãos
da aparecida. Qual ‘tremor’? Tal percepção pode suscitar não só uma forte
suspeita, como também uma profunda convicção de que não se trata de uma
autêntica aparição da Beata Virgem Maria”.
Outras críticas do bispo estão
relacionadas com a data e o aniversário das ‘supostas aparições’, que se
iniciaram no dia 24 de junho de 1981, ainda que se tenha decidido que a festa
anual se celebre no dia 25 de junho, dia em que supostamente todos os videntes
teriam presenciado as aparições. As argumentações do bispo continuam: “os
‘videntes’, desde o início do segundo dia, pediram a sua figura algum ‘sinal’
como prova da autenticidade da aparição. Segundo Ivanka, a aparecida deu o
‘sinal’ movendo os ponteiros do relógio de Mirjana: ‘o relógio girou por
completo’, ‘e ela deixou um sinal no relógio’. Mais que ridículo é estranho”.
E mais ainda: Ivanka “está segura de que
a figura deixará um sinal na montanha, talvez sob a forma de água. Após quase
quatro décadas, não existe nenhum sinal, nem água, só fantasias!”. E durante os
primeiros sete dias, “a aparecida não assume nenhuma iniciativa, nunca começa a
falar primeiro. Responde as perguntas dos ‘videntes’ de maneira genérica, de
forma bastante ambígua, inclinando a cabeça, postergando para outro momento,
prometendo o milagre da cura e deixando uma mensagem às pessoas: ‘Que as
pessoas creiam firmemente como se me visse’. E também aos franciscanos: ‘que
creiam firmemente””.
O bispo também recorda que as descrições
dos vestidos de Maria não coincidem. “Segundo as conversas com os ‘videntes’, a
aparecida se veste de maneira diferente. A figura tinha o vestido, diz Ivan,
‘de cor azul’, no primeiro dia; segundo Ivanka, ‘de cor café’, no segundo dia;
segundo os outros ‘videntes’, ‘de cor cinza’: Jakov, Mirjana e Ivanka, no sexto
dia”.
Para concluir, dom Peric denuncia
“manipulações intencionais. O interlocutor dos ‘videntes’, frei Jozo Zovko,
pároco, demonstra-se muito nervoso porque a figura aparecida não envia mensagens
concretas para as pessoas, nem para os frades; porque não desce da colina à
igreja onde está sua estátua. E mais, questiona-se se poderia ‘obrigar’ (assim,
literalmente!) a Virgem a descer e aparecer na igreja. O padre Zovko:
‘Interessa-me isto Mirjana: se a Virgem não aparecer na igreja, vocês podem
obrigá-la a aparecer na igreja? Talvez a fizesse, não é certo? Qual a sua
opinião?’. Mirjana: ‘Não sei. Não refletimos sobre isso”. O padre Zovko repete:
‘Eu acredito que poderiam obrigá-la: ‘Virgem, peço que me apareça na igreja’.
Qual a sua opinião?’. E, em seguida, Mirjana cede e pensa que isto ‘seria
melhor, porque então nem sequer a polícia nos procuraria...’”. E assim, conclui
o bipo Peric, “com as manipulações, as ‘aparições’ mudaram para a igreja no dia
primeiro de julho de 1981. Este ‘obrigar’ à aparecida descer e aparecer na
igreja é um jogo mágico, e não o Evangelho de Cristo”.
A conclusão do bispo de Mostar é que não
é possível falar em fenômenos sobrenaturais. “Tendo em conta tudo o que foi
examinado e estudado por esta Cúria diocesana, incluído o estudo dos primeiros
sete dias das supostas aparições, pode-se pacificamente afirmar: a Virgem não
apareceu em Medjugorje!”.
O bispo havia afirmado o mesmo em outros
textos do passado. As gravações mencionadas por ele, há tempo, foram
transcritas, traduzidas ao croata, ao francês e ao inglês, e publicadas em três
volumes. Estes materiais foram analisados com atenção pela comissão conduzida
pelo cardeal Ruini.
O que surpreende é que justamente no momento
em que a Santa Sé decide nomear um enviado especial do Papa, encarregado de
verificar os problemas existentes para o acompanhamento pastoral dos
peregrinos, o bispo tenha decidido intervir desta maneira, procurando
condicionar o exame sobre a natureza sobrenatural das aparições. Um exame que
agora compete à Congregação para a Doutrina da Fé. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br
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