(Mensagem
do Papa Francisco para o 50º Dia Mundial das Comunicações Sociais, que em 2016
será celebrado no dia 8 de maio).
Queridos irmãos e irmãs!
O Ano Santo da
Misericórdia convida-nos a refletir sobre a relação entre a comunicação e a
misericórdia. Com efeito a Igreja unida a Cristo, encarnação viva de Deus
Misericordioso, é chamada a viver a misericórdia como traço característico de
todo o seu ser e agir. Aquilo que dizemos e o modo como o dizemos, cada palavra
e cada gesto deveria poder expressar a compaixão, a ternura e o perdão de Deus
para todos. O amor, por sua natureza, é comunicação: leva a abrir-se, não se
isolando. E, se o nosso coração e os nossos gestos forem animados pela
caridade, pelo amor divino, a nossa comunicação será portadora da força de
Deus.
Como filhos de
Deus, somos chamados a comunicar com todos, sem exclusão. Particularmente
próprio da linguagem e das ações da Igreja é transmitir misericórdia, para
tocar o coração das pessoas e sustentá-las no caminho rumo à plenitude daquela
vida que Jesus Cristo, enviado pelo Pai, veio trazer a todos. Trata-se de
acolher em nós mesmos e irradiar ao nosso redor o calor materno da Igreja, para
que Jesus seja conhecido e amado; aquele calor que dá substância às palavras da
fé e acende, na pregação e no testemunho, a «centelha» que os vivifica.
A comunicação
tem o poder de criar pontes, favorecer o encontro e a inclusão, enriquecendo
assim a sociedade. Como é bom ver pessoas esforçando-se por escolher
cuidadosamente palavras e gestos para superar as incompreensões, curar a
memória ferida e construir paz e harmonia. As palavras podem construir pontes
entre as pessoas, as famílias, os grupos sociais, os povos. E isto acontece
tanto no ambiente físico como no digital. Assim, palavras e ações hão-de ser
tais que nos ajudem a sair dos círculos viciosos de condenações e vinganças que
mantêm prisioneiros os indivíduos e as nações, expressando-se através de
mensagens de ódio. Ao contrário, a palavra do cristão visa fazer crescer a
comunhão e, mesmo quando deve com firmeza condenar o mal, procura não romper
jamais o relacionamento e a comunicação.
Por isso, queria
convidar todas as pessoas de boa vontade a redescobrirem o poder que a
misericórdia tem de curar as relações dilaceradas e restaurar a paz e a
harmonia entre as famílias e nas comunidades. Todos nós sabemos como velhas
feridas e prolongados ressentimentos podem aprisionar as pessoas, impedindo-as
de comunicar e reconciliar-se. E isto aplica-se também às relações entre os
povos. Em todos estes casos, a misericórdia é capaz de implementar um novo modo
de falar e dialogar, como se exprimiu muito eloquentemente Shakespeare: «A
misericórdia não é uma obrigação. Desce do céu como o refrigério da chuva sobre
a terra. É uma dupla bênção: abençoa quem a dá e quem a recebe» (“O mercador de
Veneza”, Ato IV, Cena I).
É desejável que
também a linguagem da política e da diplomacia se deixe inspirar pela misericórdia,
que nunca dá nada por perdido. Faço apelo sobretudo àqueles que têm
responsabilidades institucionais, políticas e de formação da opinião pública,
para que estejam sempre vigilantes sobre o modo como se exprimem a respeito de
quem pensa ou age de forma diferente e ainda de quem possa ter errado. É fácil
ceder à tentação de explorar tais situações e, assim, alimentar as chamas da
desconfiança, do medo, do ódio. Pelo contrário, é preciso coragem para orientar
as pessoas em direção a processos de reconciliação, mas é precisamente tal
audácia positiva e criativa que oferece verdadeiras soluções para conflitos
antigos e a oportunidade de realizar uma paz duradoura. «Felizes os
misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. (...) Felizes os
pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus» (Mt 5, 7.9).
Como gostaria
que o nosso modo de comunicar e também o nosso serviço de pastores na Igreja
nunca expressassem o orgulho soberbo do triunfo sobre um inimigo, nem
humilhassem aqueles que a mentalidade do mundo considera perdedores e
descartáveis! A misericórdia pode ajudar a mitigar as adversidades da vida e
dar calor a quantos têm conhecido apenas a frieza do julgamento. Seja o estilo
da nossa comunicação capaz de superar a lógica que separa nitidamente os pecadores
dos justos. Podemos e devemos julgar situações de pecado – violência,
corrupção, exploração, etc. –, mas não podemos julgar as pessoas, porque só
Deus pode ler profundamente no coração delas. É nosso dever admoestar quem
erra, denunciando a maldade e a injustiça de certos comportamentos, a fim de
libertar as vítimas e levantar quem caiu. O Evangelho de João lembra-nos que «a
verdade [nos] tornará livres» (Jo 8, 32). Em última análise, esta verdade é o
próprio Cristo, cuja misericórdia repassada de mansidão constitui a medida do
nosso modo de anunciar a verdade e condenar a injustiça. É nosso dever
principal afirmar a verdade com amor (cf. Ef 4, 15). Só palavras pronunciadas
com amor e acompanhadas por mansidão e misericórdia tocam os nossos corações de
pecadores. Palavras e gestos duros ou moralistas correm o risco de alienar
ainda mais aqueles que queríamos levar à conversão e à liberdade, reforçando o
seu sentido de negação e defesa.
Alguns pensam
que uma visão da sociedade enraizada na misericórdia seja injustificadamente
idealista ou excessivamente indulgente. Mas tentemos voltar com o pensamento às
nossas primeiras experiências de relação no seio da família. Os pais amavam-nos
e apreciavam-nos mais pelo que somos do que pelas nossas capacidades e os
nossos sucessos. Naturalmente os pais querem o melhor para os seus filhos, mas
o seu amor nunca esteve condicionado à obtenção dos objetivos. A casa paterna é
o lugar onde sempre és bem-vindo (cf. Lc 15, 11-32). Gostaria de encorajar a
todos a pensar a sociedade humana não como um espaço onde estranhos competem e
procuram prevalecer, mas antes como uma casa ou uma família onde a porta está
sempre aberta e se procura aceitar uns aos outros.
Para isso é
fundamental escutar. Comunicar significa partilhar, e a partilha exige a
escuta, o acolhimento. Escutar é muito mais do que ouvir. Ouvir diz respeito ao
âmbito da informação; escutar, ao invés, refere-se ao âmbito da comunicação e
requer a proximidade. A escuta permite-nos assumir a atitude justa, saindo da tranquila
condição de espectadores, usuários, consumidores. Escutar significa também ser
capaz de compartilhar questões e dúvidas, caminhar lado a lado, libertar-se de
qualquer presunção de omnipotência e colocar, humildemente, as próprias
capacidades e dons ao serviço do bem comum.
Escutar nunca é
fácil. Às vezes é mais cômodo fingir-se de surdo. Escutar significa prestar
atenção, ter desejo de compreender, dar valor, respeitar, guardar a palavra
alheia. Na escuta, consuma-se uma espécie de martírio, um sacrifício de nós
mesmos em que se renova o gesto sacro realizado por Moisés diante da
sarça-ardente: descalçar as sandálias na «terra santa» do encontro com o outro
que me fala (cf. Ex 3, 5). Saber escutar é uma graça imensa, é um dom que é
preciso implorar e depois exercitar-se a praticá-lo.
Também e-mails,
SMS, redes sociais, chat podem ser formas de comunicação plenamente humanas.
Não é a tecnologia que determina se a comunicação é autêntica ou não, mas o
coração do homem e a sua capacidade de fazer bom uso dos meios ao seu dispor.
As redes sociais são capazes de favorecer as relações e promover o bem da
sociedade, mas podem também levar a uma maior polarização e divisão entre as
pessoas e os grupos. O ambiente digital é uma praça, um lugar de encontro, onde
é possível acariciar ou ferir, realizar uma discussão proveitosa ou um
linchamento moral. Rezo para que o Ano Jubilar, vivido na misericórdia, «nos
torne mais abertos ao diálogo, para melhor nos conhecermos e compreendermos;
elimine todas as formas de fechamento e desprezo e expulse todas as formas de
violência e discriminação» (Misericordiae Vultus, 23). Em rede, também se
constrói uma verdadeira cidadania. O acesso às redes digitais implica uma
responsabilidade pelo outro, que não vemos mas é real, tem a sua dignidade que
deve ser respeitada. A rede pode ser bem utilizada para fazer crescer uma
sociedade sadia e aberta à partilha.
A comunicação,
os seus lugares e os seus instrumentos permitiram um alargamento de horizontes
para muitas pessoas. Isto é um dom de Deus, e também uma grande
responsabilidade. Gosto de definir este poder da comunicação como
«proximidade». O encontro entre a comunicação e a misericórdia é fecundo na
medida em que gerar uma proximidade que cuida, conforta, cura, acompanha e faz
festa. Num mundo dividido, fragmentado, polarizado, comunicar com misericórdia
significa contribuir para a boa, livre e solidária proximidade entre os filhos
de Deus e irmãos em humanidade.
Papa Francisco
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