Jürgen
Moltmann, teólogo protestante alemão.
Nesta noite, às 20h45, junto ao Centro de Congressos João XXIII de Bergamo, o teólogo protestante alemão dará uma palestra sobre o tema.
“Pensar a esperança. Crer no futuro para
viver no presente” foi o tema de uma conferência proferida por Jürgen Moltmann
em Bergamo, na Itália, no dia 9 de maio.
Moltmann é um dos mais conhecidos
teólogos da segunda metade do século vinte, discípulo de Ernst Bloch e famoso
por sua obra “Teologia da esperança” (Queriniana, 1970). Aqui publicamos um
extrato de sua lectio, publicado pelo jornal Avvenire, 09-05-2015. A tradução é
de Benno Dischinger.
Eis
o artigo.
Os cristãos são capazes de futuro. Mas,
de qual futuro? Como se pode, afinal, falar de futuro, se nem sequer teve
início? Como se podem narrar os acontecimentos que se aproximam, mas que de
fato ainda não aconteceram? Não se trata de infundados desejos ou de visões
angustiadas e igualmente infundadas? Não é melhor dizer, com Albert Camus:
“Pensar lucidamente e não esperar em nada?”
Não, na esperança cristã não falamos dos
nossos desejos e das nossas angústias, e nem mesmo do futuro em si. Falamos de
Jesus Cristo e de seu futuro. Nós recordamos a história de Jesus Cristo: sua
vinda a este mundo, sua alegre novidade do Reino de Deus para os pobres, os
enfermos e as crianças, o seu sofrimento e sua morte na cruz – e sua gloriosa
ressurreição, com a plenitude da vida eterna que ele revelou.
A esperança cristã no futuro de Deus tem
sua sã ancoragem no tornar presente sua história e sua ressurreição. E, no meio
dia história está a sua cruz. A cruz, na comunidade de Cristo, é a pedra do
escândalo para todos os espíritos utópicos e apocalípticos. Somente quem tem
consistência ante o vulto do Cristo crucificado é esperança cristã.
Com o sinal da cruz são de fato expulsos
também os espíritos enfermos e malignos dos por eles possuídos. Somente por
trás da cruz sobre o Gólgota surge o sol da ressurreição. Somente além da cruz
de Cristo desponta a aurora do novo mundo de Deus. A esperança cristã não é, de
fato, otimismo que promete às pessoas de sucesso dias melhores. A fé em Cristo
difunde esperança aonde de outro modo não há mais nada a esperar.
Com os braços da esperança cristã
abraçamos o mundo inteiro e não damos nada nem ninguém por perdido. Assim como
o Cristo ressurgido tem o seu futuro em Deus, ele não é somente o Redentor das
nossas almas, mas também o Reconciliado do cosmos. De sua vinda esperamos, por
isso, a grande transformação do mundo “do corpo corruptível à
incorruptibilidade e do corpo mortal a imortalidade”, como anuncia o apóstolo
Paulo segundo o exemplo do profeta Isaías. Cristo há de vir, mas nós fazemos a
experiência de sua presença já aqui e agora na palavra do Evangelho e no
Espírito que nos torna vivos; nós fazemos a experiência de sua presença já no batismo
e na comunhão: nós fazemos a experiência de sua presença em companh9ia de quem
crê e em companhia dos pobres e dos enfermos. Mais intensamente, fazemos a
experiência do fato de que Jesus vive e então clamamos “Maranata, vem Senhor
Jesus”, vem rapidamente (Ap 22, 20).
Resistência e antecipação são virtudes
daqueles que esperam. No sofrimento, nas desilusões, nas dores e nas
preocupações a esperança cristã mostra a sua força confortadora e resistente.
Resistência e antecipação são virtudes daqueles que esperam. No sofrimento, nas
desilusões, nas dores e nas preocupações a esperança cristã mostra a sua força
confortadora e resistente. É confortador resistir nas dores e nas preocupações
sabendo que este não é o fim, mas que precisamente ali ainda existe algo que
vem. É encorajador não capitular diante do irrevocável, mas resistir sadios no
protesto. Em força da esperança não nos rendemos, mas permanecemos inquietos e
insatisfeitos num mundo injusto e violento. Nenhuma reconciliação com o mal!
Nas situações de sofrimento a grande tentação é render-se. Eu mesmo corri este
risco como prisioneiro de guerra da Segunda Guerra mundial. As promessas de
Deus que despertam a nossa esperança nos colocam frequentemente em contradição
com as experiências do nosso ambiente. O novo mundo de Deus tão esperado e o
velho mundo do qual temos experiência, no qual vivemos e sofremos, se
contradizem. Em tais situações, a sombra da cruz desce sobre nós.
Começamos a sofrer por um mundo injusto
e violento, porque nos colocamos contra a injustiça e a violência. Se não
esperássemos em nada, então nos adaptaríamos: o mundo é no fundo aquilo que é.
O fato que não nos adaptamos é fruto da inextinguível fagulha da esperança que
habita em nós. Pela força da esperança no novo mundo de Deus os hebreus e os
cristãos oprimidos se contaram contra histórias sobre o decurso deste mundo.
Trata-se das histórias de ressurreição do profeta Ezequiel, no capítulo 37:
veja, aqui está a planície que estava repleta de ossos estorricados dos povos
passados – mas, escuta, ali vem o espírito de Deus que os despertará e
reconduzirá os mortos à vida. Por isso, não te rendas: a morte não tem a última
palavra.
Existem as contra imagens apocalípticas,
na revelação de João, da ‘grande prostituta da Babilônia’, que em breve cairá,
e todos sabiam que com isto se entendia Roma e o império romano que perseguia
hebreus e cristãos. A imagem da ‘Jerusalém celeste’ que descerá sobre a terra e
terá duração eterna é uma contra imagem da Roma imperial que se fazia celebrar
como ‘cidade eterna’. O próprio título de Senhor, na confissão ‘Senhor é Jesus
Cristo’, é um contra título adverso aos poderosos imperadores romanos que se
faziam exaltar como ‘senhores do mundo’.
O anúncio de Deus em nome de Cristo
crucificado é, nestas condições, um discurso subversivo de Deus. Muitos
dominadores perceberam que a Bíblia, para eles, é um livro perigoso porque
chama à resistência, como o fizeram os cristãos na Coréia em 1919. “Senhor,
nosso Deus, outros patrões, diversos de ti, nos tem dominado, mas nós a ti
somente, o teu nome invocaremos” (Is 26,13): assim dizia o povo prisioneiro na
Babilônia dirigindo-se ao Deus de Israel. Esta passagem foi muito apreciada
pela Igreja professante durante a resistência contra a ditadura nazista na
Alemanha.
Todavia, na vida da esperança não
fazemos somente experiência de contradições e sofrimentos, mas também de sinais
premonitórios de antecipações. Não podemos permitir-nos dizer que este modo é
malvado e retirar-nos à vida privada, enquanto pudermos “vencer o mal com o
bem”, como aconselhava Paulo na Epístola aos Romanos 12, 21. Por isso, devemos
intervir na vida política e social do nosso povo e lutar pela verdade na
política e pelo direito dos pobres; não com violência, mas com métodos não
violentos, como ensina a teologia Minjung (na Coréia do Sul). Esta era a
esperança do Movimento social Gospel na América, esta era a esperança da
teologia da libertação na América Latina, esta era a esperança do movimento
pelos direitos civis nos Estados Unidos e esta é a esperança do movimento
ecológico na Europa: “Outro mundo é possível”.
Mas, antes de poder mudar algo em
direção do bem, devemos estar dispostos a mudar-nos a nós mesmos. O Espírito da
vida nos desperta do nosso egoísmo, da nossa indiferença com os outros. Sentimos
a paixão pela vida e abrimos o nosso espírito e as nossas mãos à vontade de
Deus. “Os pródigos do mundo futuro”, dos quais fala a Carta aos Hebreus 6,5,
nos convida a agir. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br
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