Craíbas - O missionário belga José Theisen ainda “arranhava” a
língua portuguesa quando chegou à cidade sergipana de Gararu. No primeiro
contato com os fiéis protagonizou grande polêmica quando afirmou que a cidade
“tinha muita rapariga”. A confusão era reflexo do português assimilado em
Portugal, onde rapariga significa moça.
“A
população por muito pouco não me crucificou”, lembra o religioso, que vive há
quase duas décadas na pequena Craíbas, cidade do agreste alagoano.
Natural
de Namur, próspera cidade da Bélgica [um dos países com melhor qualidade de
vida do planeta], padre José Theisen, o “missionário de apenas 78 anos”,
sobrevive de forma franciscana - seus aposentos são muito simples - mas é o
principal responsável por um trabalho social de grande impacto na sociedade
local.
Amparado
por voluntários, mantém uma creche para 80 crianças, proporciona abrigo para
jovens dependentes químicos e ainda viabiliza a adoção de crianças abandonadas.
Resistência e ameaças
No
início de sua missão em Craíbas o padre diz ter enfrentado muita resistência de
setores da classe política. Por diversas vezes, recebeu ameaças de morte. “O
bispo daquela época [Constantino Luers] não disse que a cidade era complicada.
Até tentativa de homicídio houve”, recorda José Theisen. As desavenças e desconfianças
seriam substituídas, anos depois, por apoio ao trabalho de evangelização e
transformação social do religioso belga.
Inovação
O
religioso, sempre “inconformado com o comodismo de quem pode, mas não soluciona
as questões sociais” inovou ao implantar, no salão paroquial, o ensino de
segundo grau em Craíbas.
“Nem
todos podiam viajar a Arapiraca. Pedimos os professores e o governo do Estado,
depois de muita resistência, concordou com o estudo de três turmas de jovens
carentes dentro da casa do Senhor. Depois da repercussão positiva, aí veio a
escola de segundo grau”, recorda. MM
Político ajuda, mas padre não promete
nada
As
ações do religioso não se restringem ao campo educacional. Ele também criou - e
mantém - uma creche para 80 crianças carentes cujos pais vivem em dificuldades
e geralmente não têm condições de alimentá-las.
Uma
das ruas da cidade foi fechada para servir de abrigo aos projetos sociais de
José Theisen, que mantém outro projeto polêmico dentro da igreja: proporciona
abrigo para 15 jovens carentes. Alguns deles tentam fugir da dependência
química.
Vila de casas
Os
projetos sociais tocados pelo religioso - que já edificou uma vila de casas
para famílias carentes e também mantém uma rádio comunitária - “custam” aos
cofres da igreja pouco mais de R$ 80 mil ao mês.
Questionado
pela reportagem da Gazeta de Alagoas sobre quem paga a conta, o padre Theisen
não esconde que recebe ajuda da classe política “para a qual não promete nada”
e ainda da população, que envia donativos.
“A
gente tem a idéia e busca ajuda da população. Aí, Deus é quem paga a conta”,
explica-se José Theisen.
Belgas adotam crianças abandonadas em
Alagoas
Craíbas - Em seus 18 anos de missão no Agreste, José Theisen
viabilizou a adoção por casais belgas de dezenas de crianças que tinham sido
abandonadas em hospitais ou orfanatos da região. Crianças que poderiam não ter
futuro no interior de Alagoas sobrevivem agora com dignidade em famílias que
gozam de elevado padrão de vida.
“Alguns
deles já vieram ao Brasil conhecer suas origens”, explica José Theisen, que
reúne os jovens adotivos uma vez por ano.
O
“servo e empregado de Deus” marcou sua presença na cidade com a construção de
uma estátua de Nossa Senhora. A imagem tem a altura de um prédio de dois
andares e chama a atenção de quem chega ao centro de Craíbas, na região Agreste.
40 missas por semana
“A
cidade precisava de proteção divina”, justifica o padre belga José Theisen, que
se diferencia dos demais religiosos do interior por celebrar até 40 missas por
semana. São três por dia. Todos os dias.
Quando
recebeu a reportagem da Gazeta, o padre fez questão de mostrar o cronograma de
celebrações na paróquia de Craíbas, cidade com 40 capelas distribuídas em seus
diversos povoados.
Principal
capelão do município por mais de 18 anos, José Theisen desenvolve trabalho
social na periferia de Craíbas, onde mandou construir uma casa de taipa onde
costuma dormir algumas vezes por mês.
“Precisei
dormir numa casa de taipa para que o poder público instalasse luz elétrica na
comunidade”, diz o religioso.
Palavra aos presos
Adaptado
à vida no agreste de Alagoas, padre José Theisen comprou terreno e edificou, no
alto de uma serra, a capela ao lado da qual pretende ser sepultado.
“Depois
da morte quero ser sepultado aqui em Craíbas”, confessa. Ainda “distante da
morte”, ele continua ativo e com tempo para levar a palavra divina aos detentos
do presídio e da delegacia regional de Arapiraca.
Tanto
na delegacia quanto no presídio costuma celebrar pelo menos uma missa a cada
quinze dias. “Também levo palavra de conforto aos enfermos dos nove hospitais
de Arapiraca”, diz o religioso belga, que mantém atividades de forma intensa
aos 78 anos.
“Não
sou velho. Ainda estou amadurecendo. Tenho muito o que fazer pela comunidade da
minha querida Craíbas”, reforça.
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